quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Para diretor e elenco, Central do Brasil ainda é atual

Vinicius de Oliveira, Fernanda Montenegro e Walter Salles na exibição de cópia restaurada de 'Central do Brasil' (Foto: Natali Hernandes/agenciafoto.com.br)

A história de uma ex-professora que atravessa o Brasil atrás do pai do menino Josué completou 20 anos sem envelhecer. É tão atual que a intérprete de Dora, a aposentada que escreve cartas para analfabetos no centro do Rio, sugeriu relançá-la. “Esse filme deveria ser lançado de novo. Digo isso por causa da época que estamos passando agora”, disse Fernanda Montenegro, sob muitos aplausos, na exibição da cópia restaurada de Central do Brasil, nesta terça-feira, 30, na capital paulista, durante a 42ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

“A obra fala de um menino em busca do pai, mas que na verdade também está em busca de um país. E nós estamos em busca de um país novamente”, acrescentou a atriz, referindo-se, mas sem citar nomes, ao momento politicamente conturbado que se agravou com as eleições deste ano.

Central do Brasil chegou aos cinemas em 1998, mas as primeiras ideias para o longa surgiram na mente do diretor Walter Salles em outro período delicado. “O filme foi pensando durante os anos negros do governo [Fernando] Collor e momentos após a ditadura militar. A trajetória [da protagonista] Dora é de ressensibilização depois daquela época tão traumática”, definiu o cineasta.

Comentando a onda conservadora que atingiu o país – e que junto dela vieram ataques à classe artística, Walter Salles pediu união. “Agora é hora de se reagrupar, estarmos juntos, pensar e criar novamente”, pontuou o diretor do longa vencedor do Urso de Ouro no Festival de Berlim e indicado ao Oscar na categoria Melhor Filme Estrangeiro, além de também render uma indicação a Fernanda Montenegro como melhor atriz na principal premiação da indústria.

Cena do filme 'Central do Brasil' (Foto: Divulgação)

O ator Vinícius de Oliveira, intérprete do menino Josué, lembra ainda que o cinema brasileiro já enfrentou percalços, como a censura nos tempos de ditadura militar e o financiamento escasso. “O nosso cinema não está em um caminho sólido, e esse momento que estamos passando, no qual a cultura e os artistas estão ‘apanhando’, pode ser devastador. Sempre houve resistência por parte daqueles que trabalham nesse ramo, e em muitas ocasiões o próprio público abraçou mais a produção nacional. Ainda assim, podemos estar diante de novos tempos difíceis”, lamentou em conversa com o Portal da Band.

Duas experiências profissionais, no entanto, trouxeram uma outra perspectiva, essa mais positiva, para Vinícius. O ator esteve no Nordeste do País na década de 1990 para filmar Central do Brasil, e retornou em 2014 para a região, onde rodou Boi Neon, de Gabriel Mascaro. “Encontrei um Nordeste muito diferente, mais moderno, mais possível, com pessoas distintas. Em algum momento a gente melhorou, só espero que não haja retrocessos.”

A restauração de Central do Brasil, feita pelo laboratório francês Éclair, ressaltou os tons do sertão nordestino captados pela fotografia de Walter Carvalho e a trilha sonora marcante assinada por Jaques Morelenbaum e Antônio Pinto. O grande poder do filme, entretanto, está em emocionar um público diverso. A história de Dora e Josué toca até mesmo quem não conhece a realidade dura da maioria dos brasileiros. É difícil segurar as lágrimas diante da construção de uma amizade tão improvável dos dois e, principalmente, do reencontro da professora aposentada com a sua própria compaixão, há muito tempo perdida.



Além das atuações de Fernanda Montenegro e Vinícius de Oliveira, o filme também traz um dos trabalhos de Marília Pêra, morta em 2015. Foi para a colega de cena que Fernanda dedicou a sessão. “Não lembro dela para entristecer, embora ela faça mesmo muita falta, mas porque essa noite é dela. Talvez pela sua ausência, essa noite é totalmente dela”, concluiu a atriz.

(Karen Lemos - Portal da Band)

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Agressões em período eleitoral afetam turismo LGBT

Paulo Pinto/Fotos Públicas

Não são só os brasileiros que estão preocupados com a recente onda de agressões que se intensificou com o período eleitoral no País. Ciente dos incidentes que repercutem na mídia internacional, turistas de um nicho bastante lucrativo já estão adiando viagens com receio do clima de animosidade no Brasil. A informação é da Câmara de Comércio e Turismo LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) do Brasil, voltada para um segmento cujo público-alvo gasta em média, segundo dados mundiais, 30% a mais do que o turista convencional.

“Independentemente de quem vencer as eleições, já se estabeleceu uma imagem ruim para o País. Quem viaja para cá tem essa preocupação adicional em mente, porque esse turista está se informando sobre os ataques pela imprensa internacional. Nós voltamos a virar notícia de uma forma negativa e isso vai impactar no mercado. De agora em diante, nosso trabalho será ainda maior no sentido de amenizar isso e tentar avançar em melhorias para o setor”, explica Ricardo Gomes, presidente da Câmara LGBT, ao Portal da Band.

Ainda sem saber qual será o real impacto no turismo brasileiro, Ricardo conta que soube de turistas que estão adiando viagens ao Brasil por conta de uma série de agressões registradas no País. Um levantamento feito pela Agência Pública e Open Knowledge Brasil registrou mais de 50 ataques durante o período eleitoral. Os casos são publicados diariamente no mapa Vítimas da Intolerância, criado pela parceria.

Relatos de testemunhas dos episódios mostram que as agressões têm contexto político. Em um dos ocorridos mais graves, o mestre de capoeira e compositor Romualdo Rosário da Costa, de 63 anos, conhecido como Moa do Katendê, foi morto a facada no início do mês. O autor do crime, Paulo Sérgio Ferreira de Santana, confessou o assassinato e alegou discussão política como motivação.

Nem sempre a preferência política dos envolvidos nos ataques fica clara, mas, em uma eleição extremamente polarizada, há casos em que essa predileção sobressai. No assassinato de uma transexual no centro de São Paulo no último dia 16, testemunhas disseram ao jornal Folha de S. Paulo que os agressores teriam gritado o nome do candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro (PSL) antes de esfaquear a vítima. Há também casos de agressão por parte do eleitorado que rejeita Bolsonaro, como um suposto atropelamento envolvendo um professor da Universidade do Recôncavo Baiano (UFRB), que teria investido com o carro contra comerciantes de camisetas do candidato do PSL. Em nota, a instituição disse que o professor se sentiu ameaçado.

Ricardo Gomes ressalta que alguns desses ataques têm como alvo a população LGBT, o que pode afetar diretamente o segmento do turismo brasileiro a médio e longo prazo. “Não importa quem vença essas eleições, o prejuízo já existe. Aqueles que que tinham ódio contra gays, até contra negros e mulheres, mas ficavam quietos porque não era correto expressar esse pensamento, agora ‘saíram do armário’”, observa o presidente da Câmara LGBT. “O Brasil já tem problemas de segurança que afeta a decisão do turista de viajar ou não para cá. Com essa onda de ódio, vai afetar mais ainda. Provavelmente passaremos anos trabalhando para desfazer uma imagem ruim que se estabeleceu nos últimos dias”, acrescenta.

Ele conta ainda que, por ser uma referência, a Câmara de Comércio e Turismo LGBT tem recebido ligações de brasileiros preocupados com a situação do País. “Nos últimos 15 dias atendemos pessoas que pedem dicas de como se proteger ou atendimento psicológico por estarem deprimidos com o caminhar das coisas”, diz. “Nós começamos a indicar serviços que tratam melhor desses assuntos e também damos conselhos, como não entrem em desespero ou não andem sozinhos na rua de madrugada. A violência contra LGBTs sempre existiu, mas nunca nesses índices.”

Turismo LGBT

De acordo com dados da Organização Mundial do Turismo, para cada 10 turistas no mundo, um é do segmento LGBT e cerca de 15% da movimentação financeira turística mundial é gerada por este grupo. Estudos do Conselho Mundial de Viagens e Turismo revelam ainda que o turista LGBT viaja quatro vezes mais do que outros segmentos e têm gasto 30% superior na comparação com turistas convencionais. “Estamos falando, portanto, de mercado, de negócios, de empregabilidade. Nós vamos levar a sério a economia do Brasil ou não?”, ressalta Ricardo Gomes.

O presidente da Câmara LGBT aponta ainda que as belezas do Brasil e as variadas atrações que o País oferece para todos os gostos nos coloca em evidência mundial. O Rio de Janeiro, por exemplo, já figurou em lista de destinos ‘gay-friendly’ pela Lonely Planet, maior editora de guias de viagem do mundo, que já chamou a cidade de “a capital gay da América Latina”.


Bandeira gay é vista na Praia de Ipanema, no Rio (Foto: Jeff Belmonte via Wikimedia Commons)

São Paulo, por sua vez, teve sua Parada do Orgulho Gay registrada no Guinness World Records como a maior do mundo, e é a primeira cidade da América Latina que aparece em uma lista da Nestpick sobre destinos com uma ativa comunidade gay. Segundo a Embratur, outras cidades como Belo Horizonte, Salvador, Florianópolis e Recife também atraem esse público por causa de atrações e políticas públicas voltadas para o segmento.

Visando essa parcela importante do mercado, o Ministério do Turismo e a Embratur firmaram com a Câmara de Comércio e Turismo LGBT do Brasil um convênio para promover esse nicho dentro e fora do País. As ações desta parceria vão desde divulgar o Brasil como destino ‘gay-friendly’ em convenções internacionais como começar a credenciar cidades como destinos “amigáveis” para o turista LGBT a partir de critérios que estão sendo estabelecidos.

Esse convênio tem duração de cinco anos, mas, segundo o presidente da Câmara LGBT, pode ser cancelado pelo governo que estiver no poder. “É possível cancelar com um aviso de 60 dias de antecedência, mas vamos cobrar explicações sobre os motivos do cancelamento caso isso venha a ocorrer. Pretendemos ser resistentes, de forma pacífica e ordeira, mas é preciso prestar contas para a sociedade quanto a isso”, completa Ricardo.

Em 2016, o Ministério do Turismo lançou ainda uma cartilha, destinada aos serviços que têm contato direto com o viajante em restaurantes, hotéis e serviços da cadeia turística nacional, com orientações no atendimento à pessoa que se identifica como LGBT. O objetivo da iniciativa é evitar casos de preconceito e comportamento inadequado com o turista devido a sua identidade de gênero ou sexualidade.

À reportagem, o instituto diz acreditar que o setor pode ajudar na redução da intolerância. "Isso eleva a importância do trabalho que desenvolvemos, uma vez que o turismo promove o entendimento das diferenças e a inclusão cultural e social. O contato é uma ferramenta importante para quebra de paradigmas e enfraquecimento de preconceitos", pontua em nota.

(Karen Lemos - Portal da Band)

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

TRE libera propaganda com morte de ladrão. 'É a nossa realidade', diz candidata

Reprodução

O Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) derrubou a liminar que suspendia a veiculação na TV da propaganda eleitoral da candidata a deputada federal por São Paulo Kátia Sastre (PR). O desembargador federal Fábio Prieto de Souza decidiu nesta semana julgar improcedente a representação da coligação formada por PSOL e PCB, que requeria a proibição da peça.

Na propaganda, a policial militar utilizou imagens em que aparece reagindo a um assalto em frente à escola onde foi buscar sua filha, em Suzano, na Grande São Paulo, em maio deste ano. Na ocasião, ela atirou no assaltante, que morreu momentos depois. “Atirei e atiraria de novo”, diz Sastre na inserção.

No início do mês, a liminar havia sido deferida com base no inciso IV do artigo 17 da Resolução nº 23.551/2017, que proíbe a veiculação de propaganda que incite o atentado contra pessoas. Fábio Prieto considerou, no entanto, que as imagens são de legítima defesa da PM. “Atentado contra pessoa não é reação a atentado contra pessoa”, escreveu em sua decisão.

O desembargador também desconsiderou o argumento de que crianças poderiam testemunhar as imagens no horário eleitoral. “É direito-dever dos pais, não do Estado, menos ainda da Justiça Eleitoral, resolver quais cenas de violência - legítima ou ilegítima – devem ser acessíveis aos filhos”, pontuou.

‘É a nossa realidade’, defende a candidata

Em entrevista ao Portal da Band, Kátia Sastre disse que as imagens “não são nenhuma novidade”, já que circularam pela internet e até no noticiário internacional na ocasião do ocorrido. “O que aconteceu ali não incita o crime. Foi um ato de legítima defesa. [As cenas mostram] um malfeitor colocando em risco a vida de crianças e de mães em frente a uma escola. Infelizmente é a nossa realidade.”

Para a candidata, as crianças já são expostas a conteúdo impróprio como, por exemplo, cenas de sexo em novelas. “Cabe aos pais avaliar o que o filho pode assistir ou não. É o que eu faço com as minhas filhas, por exemplo. Inclusive sempre oriento elas de que alguém pode chegar e tentar roubar, fazer algo ruim; elas precisam saber disso, têm que ter ciência”, acrescentou.

Kátia Sastre esperava que a propaganda levantaria uma discussão acalorada. “Sempre há críticas, normalmente daqueles que são de esquerda. Mas eu também contava que ganharíamos essa causa porque os elogios, o apoio e o reconhecimento da população são maiores do que as críticas - que acabam se perdendo, nem dá tempo de prestar atenção nelas.”

A candidata disse ainda que decidiu usar as imagens porque tratam-se da ocorrência que a fez ficar conhecida nacionalmente, e também porque passa a mensagem da principal bandeira de sua candidatura: expor os problemas de segurança pública no País e sugerir que irá enfrentá-los caso seja eleita. “Ninguém aguenta mais essa situação de insegurança em que vivemos. Precisamos agir urgentemente em relação a isso. A impunidade, da forma como vem acontecendo, não dá mais. É um fato que acontece todos os dias, mas não é toda câmera que flagra”, afirmou.

Peça incita a violência como solução de problemas, diz coligação


A coligação Sem Medo de Mudar São Paulo, formada por PSOL e PCB, vai recorrer da decisão no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por não concordar com os argumentos expostos pelo desembargador do TRE. “Em dado momento, [o desembargador] coloca a questão da liberdade de expressão; para nós, isso não está acima de nenhum outro direito. Expor, em horário nobre, uma pessoa sendo assassinada brutalmente, independente das circunstâncias, reforça a violência e vai contra preservar a integridade das crianças que estão assistindo ao horário eleitoral, transmitido em rede nacional, em pleno horário nobre”, afirma Juninho, presidente da executiva estadual do PSOL São Paulo e candidato a deputado estadual, à reportagem.

A coligação argumenta ainda que a propaganda mostra reação a um assalto – ação que não é recomendada por alguns especialistas no assunto. “O assaltante, inclusive, atirou de volta, mas a arma falhou. Foi a sorte. Se isso não tivesse acontecido, a policial, as outras mães ou as crianças poderiam ter sido alvejadas.”

Juninho defende que é possível falar dos problemas de segurança pública no País sem a necessidade de exibir imagens chocantes. “Usar uma cena dessa como propaganda eleitoral é incitar a violência como a solução para esses problemas, que são estruturais. Não acreditamos que se combate violência com mais violência. Vários estudos mostram, aliás, que a polícia que mais mata também é a polícia que mais morre”, exemplifica.

Para ele, é preciso pensar no combate à violência mais pela inteligência policial do que pela repressão. “A ideia do ‘punitivismo’ legitimada pela propaganda [de Kátia Sastre] reforça o genocídio da juventude negra, por exemplo; [genocídio] que matou a nossa Marielle Franco, cujo assassinato ainda não foi explicado mesmo após seis meses do crime. Repressão sem inteligência é como jogar gasolina no fogo”, resume.

(Karen Lemos - Portal da Band)

terça-feira, 11 de setembro de 2018

Mãe vende arranjos de flores para ajudar trabalho solidário da filha

Arquivo pessoal

Falar da filha Gabriela enche a jornalista Kety Shapazian de orgulho. Foi por causa dela que Kety viveu uma experiência única e marcante em 2015, quando embarcou para a Grécia, no ápice da crise migratória na Europa, para ajudar refugiados da África e do Oriente Médio, principalmente, que fugiam de guerras, perseguições políticas, fome, entre outros muitos problemas que ainda persistem nessas regiões.

A vivência também a fez abrir um ateliê de flores, onde ela mesma cria e vende arranjos em São Paulo. Parte do lucro é para custear o trabalho voluntário que Gabriela continua realizando na Europa desde a primeira viagem do tipo que fez ao lado da mãe. “Fui com Gabriela para Grécia em 2015 por causa dela. Se fosse por mim, eu teria ficado chorando no Facebook”, conta. “Eu nunca pensei em viajar para outro país e ajudar os outros, mas foi exatamente isso que aconteceu durante 45 dias. Quando tiver 90 anos de idade, ainda vou me lembrar de cada detalhe, cada emoção que vivi durante essa experiência.”

As histórias tristes dos refugiados que Kety conheceu, bem como a alegria que sentiu ao poder ajudá-los, marcaram tanto a jornalista quanto a sua filha, que decidiu continuar fazendo esse trabalho até hoje. “É o que ela faz da vida agora, não é só um projeto de férias escolares. O negócio dela é ajudar os outros, trabalhando em campos de refugiados na Grécia e na Turquia, ajudando no acolhimento, na integração deles e até dando aulas de inglês. É uma experiência ótima para ela também, que aprende muito lá fora. Tenho uma filha de 18 anos globalizada, completamente fora da curva, e isso é algo que me orgulha muito”, acrescenta Kety.

Para custear as viagens que a filha faz a cada 90 dias - tempo de permanência permitido pelo visto -, a jornalista decidiu abrir uma empresa de arranjos de flores, que batizou de Flores para os Refugiados. O negócio começou informalmente em 2016, quando Kety vendia flores nos semáforos da cidade. “Engraçado que eu nunca havia trabalhado com isso antes. Eu fazia alguns arranjos, de forma despretensiosa, em casa mesmo. Fui aprendendo na marra, vendo referências na internet, e decidi profissionalizar”, conta à reportagem.

No ateliê, é possível encontrar todo tipo de arranjo, além de encomendar decoração para festas, casamentos e até contratar entregas mensais. “O universo de arranjos de flor é imenso, dá para fazer um milhão de coisas. E quem compra esse produto, porque gosta ou acha bonito, sabe também que estará apoiando o trabalho que minha filha realiza lá fora.”

Arquivo pessoal

Xenofobia

Ainda que não canse de exaltar o exemplo que sua filha dá ao ajudar os outros, Kety Shapazian reforça que, ao mesmo tempo, estranha o fato de Gabriela virar notícia por esse motivo. “Ela não deveria ser uma exceção. Ajudar quem precisa tinha que ser algo normal, não um diferencial.”

 Gabriela recebendo uma refugiada afegã em Lesbos, na Grécia (Foto: Maciej Moskwa)

Em meio a uma crise migratória também vivida no Brasil, com o fluxo de imigrantes da Venezuela aumentando enquanto o país vizinho passa por dificuldades financeiras e conflitos políticos internos, a jornalista faz um apelo para que as pessoas tenham mais empatia com o outro.
“Temos visto muita xenofobia, muita coisa errada, não só onde minha filha está, mas também nos Estados Unidos e até no Brasil. A gente precisa se colocar no lugar do outro, esse outro sendo refugiado ou não, até porque refugiados são pessoas como a gente, e quando passamos a vê-los dessa forma, muitas barreiras caem”, pontua Kety.

Em algumas situações, essa dificuldade de compreender o outro leva a casos extremos de violência, como o ocorrido na última sexta-feira, 7. Em Roraima, um brasileiro e um venezuelano morreram após um suposto furto na capital Boa Vista.

“Sempre penso que, no futuro, podemos ser nós, brasileiros, passando por uma situação parecida com a que os venezuelanos estão enfrentando agora. Não dá para saber o que vai acontecer daqui a 30 anos, por exemplo. Minha filha sempre fala que se um dia ela precisar de ajuda, ela vai querer alguém do outro lado a recebendo com um prato de comida, um direcionamento, até mesmo um abraço. Isso faz toda a diferença”, conclui.

(Karen Lemos - Portal da Band)

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

TRE-SP suspende propaganda eleitoral de PM matando assaltante

Reprodução

O Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) deferiu liminar suspendendo a veiculação na TV da propaganda eleitoral da candidata a deputada federal por São Paulo Kátia Sastre (PR).

Para promover a candidatura, a policial militar usou imagens em que aparece reagindo a um assalto em frente a escola onde foi buscar sua filha, em Suzano, na Grande São Paulo, em maio deste ano. Na ocasião, ela atirou no assaltante, que morreu momentos depois.

As cenas, reproduzidas sem nenhuma censura, incomodaram alguns eleitores que, pelas redes sociais, reclamaram das cenas violentas exibidas em rede nacional duas vezes ao dia: às 13h e às 20h30. Pelo Twitter, um internauta chegou a mencionar que estava com os filhos pequenos assistindo à TV quando foi surpreendido pelas imagens.

No Facebook, onde a própria candidata compartilhou a propaganda em seu perfil, o vídeo foi previamente censurado e só é exibido após o usuário concordar com o alerta de conteúdo sensível.

A propaganda, que também recebeu muitos elogios na internet, foi denunciada ao TRE-SP pela coligação Sem Medo de Mudar São Paulo, composta pelos partidos PSOL e PCB.

O Portal da Band apurou que o tribunal emitiu a liminar na tarde desta quarta-feira, 5, e ainda estabeleceu multa de R$ 5 mil a cada veiculação.

A medida passa a valer logo que a candidata for notificada da decisão. A reportagem entrou em contato com a equipe de Kátia Sastre, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria.

Irregularidades

A decisão do TRE-SP foi baseada no inciso IV do artigo 17 da resolução 23.551 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que trata de condutas ilícitas em campanha eleitoral nas eleições. O inciso em questão diz que não será tolerada propaganda “de incitamento de atentado contra pessoa ou bens”.

Segundo o advogado especialista em direito eleitoral Cristiano Vilela, não é somente esta irregularidade que a peça apresenta. “Essa propaganda, no meu entender, fere a legislação que estabelece que não se pode provocar incitação à violência (inciso I do artigo 243 do Código Eleitoral) ou imagens que criem estados mentais, emocionais ou passionais (artigo 242 do Código Eleitoral); ao meu ver, cenas de violência e morte, durante o horário eleitoral, provocam esse estado de sensibilização, o que é totalmente irregular”, explica ao Portal da Band.

Vilela acrescenta ainda que a candidata não poderia estar usando a farda da Polícia Militar no programa eleitoral (artigo 40 da lei eleitoral 9504/97) ou qualquer farda confeccionada para parecer como sendo da corporação. “Uma foto ou uma imagem da candidata com uniforme parecido com o da polícia pode gerar confusão no eleitor, o que também é uma irregularidade”, ressalta o especialista.

Foi com base em um entendimento nessa linha que o ministro Sergio Banhos, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ordenou a suspensão de propagandas do PT na televisão, por exemplo. Segundo ele, as peças não explicitavam que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não é candidato do partido e causavam dúvidas no eleitor.

Propagandas do tipo podem ser denunciadas por adversários na corrida eleitoral, partidos políticos ou coligações, mas também por cidadãos comuns. “Qualquer um pode acessar o canal de denúncias de propagandas irregulares que a Justiça Eleitoral disponibiliza, ou também denunciar para as procuradorias regionais eleitorais de seu Estado”, lembra Vilela.

(Karen Lemos - Portal da Band)

quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Primeira candidata negra ao Senado por São Paulo comenta críticas sobre cabelo alisado

Divulgação

Escolhida pelo MDB, com Marcelo Barbieri, para disputar uma das duas vagas ao Senado Federal pelo Estado de São Paulo, Cidinha Raiz está no início da campanha eleitoral e tem chamado atenção mais pela aparência do que por suas propostas que, segundo ela, envolvem políticas para mulheres e negros.

Ao lado de Paulo Skaf, emedebista candidato ao governo paulista, Cidinha tem viajado pelo Estado e, vez ou outra, escutado comentários sobre seu visual, principalmente a respeito de seu cabelo, que atualmente é curto e alisado. “Não é de agora que ouço esse tipo de coisa, mas como estou mais exposta devido à campanha, essas críticas estão mais frequentes”, conta.

Mulher negra, a primeira a ser candidata ao Senado por São Paulo, Cidinha cita à reportagem o que chamou de “ditadura” para que o negro use os cabelos de forma natural, ou então ao estilo black power. “Me chama atenção o quanto as pessoas se preocupam com esse tipo de coisa e perdem tempo olhando para um cabelo”, diz ela, que também menciona casos de jovens negros que são alvo de bullying nas escolas devido à aparência, ou porque alisam os fios, ou porque os deixam naturais. “Eu acho o cabelo black maravilhoso, mas a questão não é essa, é de como isso mexe com a autoestima do negro”, explica.

A psicóloga de 61 anos, que é pós-graduada em História da África e do negro no Brasil, falou também que já teve vários estilos de cabelo na vida, e que isso não tira sua essência de “mulher negra, pobre e nascida na periferia”. “Se eu pintar meu cabelo de loiro, vou continuar sendo negra. Não é isso que vai definir a minha personalidade. Black ou não, liso ou não, o cabelo é meu. A gente tem que se sentir bem do jeito que é, sem ficar nessa ditadura que nos limita sob o ponto de vista do que os outros acham que é certo ou que é bom.”

Até que sua candidatura fosse lançada, Cidinha Raiz não tinha redes sociais, mas precisou criar perfis em várias plataformas devido à campanha eleitoral, e já se deparou com comentários, inclusive de seguidores, recomendando “um bom cabeleireiro” para ela. “Eu já tenho o meu cabeleireiro, que pode não ser bom para você, mas é bom para mim”, argumenta.

“Não se mede as pessoas pela aparência, mas pela capacidade. Na política, eu serei eu mesma. Não vou para a favela de terno e saltinho, vou como sempre fui: de tênis e calça jeans, porque o cargo não tem que mudar a pessoa, mas precisa ser usado a favor das pessoas.”

Partido político

Além das observações sobre seu visual, a candidata também menciona que já ouviu críticas ao seu partido, o centrista MDB, principalmente por parte de legendas da esquerda. “Os partidos que mais questionam minha sigla estão indicando homens brancos para o Senado, inclusive o próprio PT”, afirmou Cidinha ao citar a maior legenda alinhada a essa ideologia, que está lançando Eduardo Suplicy e Jilmar Tatto para os cargos disponíveis na Casa.

“Nenhum partido, de direita ou de esquerda, indicou uma mulher negra para o Senado; portanto, eles não têm nem o direito de criticar”, pontua a psicóloga. “Mas também acho que agora é o momento de esquecer bandeiras políticas e se unir em torno de causas que, de fato, criem políticas públicas que atendam às demandas do Estado de São Paulo.”

Entre as propostas da candidata está tornar o feminicídio crime hediondo, negociar com empresas privadas o acesso de mulheres vítimas de violência e jovens negros no mercado de trabalho, e fomentar o empreendedorismo do jovem negro pela qualificação na educação por meio de entidades de ensino como Sesi, Senai e Sebrae.

(Karen Lemos - Portal da Band)

sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Candidatos ao governo de São Paulo se enfrentam em debate na Band

Kelly Fuzaro/Band

A Band realizou, nesta quinta-feira, 16, o primeiro encontro entre os candidatos ao governo do Estado de São Paulo. Participaram do encontro os seguintes postulantes ao cargo: Márcio França (PSB), Rodrigo Tavares (PRTB), Paulo Skaf (MDB), Marcelo Candido (PDT), João Doria (PSDB), Luiz Marinho (PT) e Lisete Arelaro (PSOL).

Nesta ordem, no primeiro bloco do debate, os candidatos responderam a uma pergunta dos leitores do Jornal Metro sobre segurança da população do Estado. França respondeu que irá valorizar os policiais, como fez ao homenagear a cabo da PM Katia Sastre, que matou um assaltante na porta de uma escola. Tavares focou no déficit de policiais e afirmou que o inimigo das forças da segurança é o próprio governo, e ele quer mudar isso. Já Skaf quer deixar a lei mais rígida e obrigar que presos condenados cumpram suas penas. “Nada de saidinhas ou visitinhas”, disse.

Candido falou sobre ações preventivas, como ruas bem iluminadas, espaços urbanizados e envolvimento da comunidade na questão. Doria citou melhora de salário dos policiais, padrão Poupatempo em delegacias e ampliação de batalhões padrão Rota. Marinho criticou os 24 anos de PSDB que “não fez nada” pela segurança; ele disse que irá contratar investigadores e não vai admitir que a polícia trate um jovem do Jardins diferente de um jovem da periferia. Por fim, Lisete quer contratar dez mil policiais civis, abrir as delegacias na madrugada e recompor as delegacias da mulher.

Ainda neste bloco, candidatos perguntaram para candidatos. Candido provocou Doria sobre segurança alimentar e citou a farinata, que chamou de ração humana. Doria disse que Candido estava mal informado e que o programa iria complementar as refeições, e não substitui-las.

O petista Marinho também criticou Doria e disse que o programa Corujão da Saúde não diminuiu as filas e foi apenas “peça de publicidade” de sua gestão. Na réplica, o tucano defendeu o programa que chamou de “grande sucesso” do seu mandato.

No segundo bloco, jornalistas do Grupo Bandeirantes fizeram perguntas aos candidatos, com comentários de seus adversários na corrida eleitoral. Rafael Colombo perguntou para Skaf e França sobre as linhas do Metro e da CPTM. O emedebista prometeu 200 quilômetros de linha para o Metrô, além de 22 conexões com a CPTM. Já França disse que irá indenizar os passageiros que tiveram prejuízos durante falhas do serviço.

Marina Machado questionou Doria e Skaf sobre a crise hídrica. O tucano falou que irá propor um plano estadual para redução de conta àqueles que economizarem água. Já Skaf prometeu combater o desperdício da própria Sabesp, da captação até a entrega de água, além de tratamento de esgoto.

Sandro Barboza quis saber a opinião de Marinho e Tavares sobre o baixo desempenho escolar em São Paulo. O petista sugeriu período integral de ensino para resolver o atraso de aprendizagem e também dobrar o salário dos professores da rede estadual. Tavares propôs aumento do horário pedagógico e monitoramento por câmeras nas escolas.

Em nova rodada de perguntas, Colombo questionou Candido e Marinho sobre o aumento do teto salarial dos servidores públicos do Estado. Candido sugeriu uma reforma tributária para aumentar a receita e disse que não concorda com o aumento salarial do funcionalismo público. Já Marinho falou que tiraria o auxílio moradia de juízes para fazer essa compensação, além de também propor uma reforma tributária que não prejudique os mais pobres.

No terceiro bloco, os candidatos voltaram a fazer perguntas para adversários de sua escolha. Nesta rodada, Doria e Marinho se alfinetaram; o petista disse que o tucano “largou o povo” da capital ao sair da prefeitura para se candidatar e pediu uma análise do adversário sobre a avaliação baixa de sua gestão. Doria respondeu que se estivesse tão mal, não estaria na liderança das pesquisas de intenção de voto.

O tucano continuou a provocação e disse que Marinho é réu na Justiça por suposto desvio de verba na construção de um museu em homenagem a Lula em São Bernardo do Campo, cidade da qual foi prefeito. Marinho pediu celeridade nesse processo para provar que não houve desvio de dinheiro e falou da mulher do candidato, Bia Doria, que foi chamada para depor sobre suposto mal uso de verba pública em um santuário do padre Marcelo Rossi. O tucano, que pediu respeito à sua mulher nas considerações finais, citou Lula para alfinetar seu adversário. “Onde anda Lula? Preso em Curitiba. Onde anda Zé Dirceu com sua tornozeleira eletrônica? Onde andam os tesoureiros do PT? Presos ou respondendo a processos.”

Na sequência, França citou episódios de corrupção envolvendo o MDB e quis saber de Paulo Skaf se o presidente Michel Temer é um homem honrado. “Essa história de padrinho não deu certo no Brasil e não faço política assim”, respondeu o emedebista.  Perguntando para Tavares, Doria também falou sobre corrupção; o candidato do PRTB falou que é lamentável discutir ficha corrida e não propostas no debate.

Candido, em uma pergunta endereçada para Lisete, voltou a falar sobre políticos que saem do cargo para disputar eleição, em clara provocação a Doria. “Em alguns casos a população deu graças a Deus e agora tem chance de corrigir o voto”, alfinetou a candidata do PSOL. Em outro questionamento, desta vez de Tavares para Marinho, o petista chegou a ser vaiado quando falou de Lula, afirmando que o ex-presidente é a esperança para o Brasil. “Essa é a razão de ele liderar as pesquisas, inclusive no Estado de São Paulo”, disse Marinho.

No quarto e último bloco, os candidatos fizeram as suas considerações finais


(Karen Lemos - Portal da Band)

quinta-feira, 16 de agosto de 2018

Pannunzio: debates obrigam candidatos a falarem sobre o que importa à população

Divulgação

O primeiro encontro entre os candidatos ao governo de São Paulo acontece nesta quinta-feira, 16, às 22 horas, na Band. Para mediar mais um tradicional debate realizado pela emissora, foi escalado o jornalista Fabio Pannunzio, que considera este evento como uma “bandeira de largada” para as eleições.

“[O primeiro debate] é aquele que acaba definindo a posição de campo em que cada candidato vai atuar, quem vai brigar com quem, quem implicará com quem, enfim, a partir daí é que os postulantes vão construindo suas teias de estratégia”, resumiu Pannunzio. “E para o telespectador também é um evento importante, já que é o momento em que os candidatos entregam o ‘cartão de visitas’ para o eleitor.”

Neste ano, segundo o mediador, as regras estão mais flexíveis. “Com destaque para a ampliação do confronto direto entre os convidados, a escalação de temas que são prioritários para a população e que obrigam os candidatos a falar sobre esses assuntos; além disso, os postulantes terão liberdade para escolher com quem vão debater”, detalha.

Uma das regras inovadoras do debate desta quinta é a possibilidade de um mesmo candidato ser questionado duas vezes pelos contendores. “Isso faz com que seus conhecimentos sejam testados e também incentiva o confronto, uma forma de distinguir as ideias de cada um dos convidados.”

Esses detalhes foram definidos em reunião com representantes de partidos. Participarão do debate, que terá ao todo quatro blocos, os seguintes candidatos: Márcio França (PSB), Rodrigo Tavares (PRTB), Paulo Skaf (MDB), Marcelo Cândido (PDT), João Doria (PSDB), Luiz Marinho (PT) e Lisete Arelaro (PSOL).

No primeiro bloco, os postulantes ao cargo também responderão nesta sequência a uma pergunta única feita pelos leitores do Jornal Metro. Em seguida, com base em uma pesquisa feita pela Band, será definido um tema para que os candidatos debatam entre eles. Todos perguntarão uma vez, por ordem de sorteio, e cada candidato pode ser perguntado até duas vezes.

No segundo bloco, as perguntas serão feitas por jornalistas do Grupo Bandeirantes. No bloco seguinte, os candidatos vão fazer perguntas para outros candidatos, com a sequência mais uma vez definida por sorteio. No quarto e último bloco, as considerações finais de cada participante.

Em caso de ofensa pessoal ou moral, o candidato poderá pedir direito de resposta, que será analisado por um comitê formado por jornalistas e um advogado. Caso seja concedido, o ofendido terá um minuto para responder.

Prevendo trocas de farpas, o mediador pede ainda que o eleitor atente-se às perspectivas colocadas por cada postulante ao cargo de governador. “Desconfie do que eles falam”, sugere Pannunzio. “Ao invés de já escolher seu candidato e ficar torcendo por ele, desconfie – esse é o melhor caminho para chegar até um voto consciente.”

(Karen Lemos - Portal da Band)

segunda-feira, 13 de agosto de 2018

'Foi uma ironia, isso não existe', esclarece criadora da Ursal

Reprodução/Facebook

Se a Ursal (União das Republiquetas Socialistas da América Latina) fosse um projeto que realmente existisse, a sua “fundadora”, a socióloga Maria Lucia Victor Barbosa, estaria mais do que orgulhosa.

Pelas redes sociais, principalmente no Twitter e no Facebook, não se fala de outra coisa desde que o candidato à Presidência da República pelo Patriota, Cabo Daciolo, citou o suposto plano comunista de unir países latino-americanos no debate presidencial da Band, que aconteceu na última quinta-feira, 9.

“Coitado do Cabo, ele não sabe que a Ursal não existe”, riu a socióloga, que falou sobre o real significado da sigla (seriam republiquetas, e não repúblicas, o que reforça a sátira) e esclareceu a origem do meme em entrevista à Rádio Bandeirantes.

“Em um artigo que publiquei em 2001, analisando a ida do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a Cuba para discutir sobre o Foro de São Paulo [conferência de partidos de esquerda], eu fiz uma ironia: ‘será que querem fundar a Ursal?’”, explicou.

Maria Lucia lembra que na época da publicação do artigo, circularam histórias tratando o projeto comunista como verdade, mas nada comparado ao que tem acontecido desde que o candidato fez menção à Ursal no encontro de presidenciáveis.


“Eu quase cai da cadeira quando ouvi o Cabo Daciolo falar disso de forma tão enfática. Nem Simón Bolívar [militar venezuelano que lutou contra a colonização na América Latina] conseguiu unir os países dessa forma”, riu. “E aí você vê como nascem as teorias da conspiração.”

A socióloga tem observado um medo crescente do comunismo, principalmente nas redes sociais, mas, para ela, essa possibilidade não concreta. “Não temos partidos políticos com ideologia, nem de esquerda e nem de direita. Só existe um ‘lado’, que é o de cima, o do poder. [Os partidos] são trampolins para se chegar lá”, opina.

Coincidência ou não, no momento em que Maria Lucia viu uma antiga brincadeira sua viralizar na internet, ela prepara um artigo sobre a importância das redes sociais. “É o quinto poder”, define. “O impeachment da Dilma [Rousseff], por exemplo, nasceu ali e transbordou para as ruas. O Congresso só aceitou porque o político quer ficar bem com a opinião pública”, ressalta a socióloga, que está ansiosa para ver até onde vai a influência da web nas eleições deste ano. “Mesmo sendo um ambiente caótico, as redes sociais funcionam”, conclui.

(Karen Lemos - Portal da Band)

sexta-feira, 10 de agosto de 2018

Para Flávio Bolsonaro, franqueza do pai ameaça os adversários

Karen Lemos/Portal da Band

O deputado estadual Flávio Bolsonaro (PSL) disse que o pai, o candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL), chega a ameaçar seus adversários por ser uma pessoa “honesta e verdadeira”, mesmo quando provocado.

“Os outros candidatos sabem da reação dele quando é injustiçado ou agredido”, afirmou.

Flávio acompanhou o pai no primeiro debate entre os postulantes ao Palácio do Planalto que a Band realizou nesta quinta-feira, 9.

Para o político, que este ano tentará uma vaga no Senado Federal pelo Rio de Janeiro, Jair Bolsonaro “tem a verdade do seu lado”, o que o ajudaria a lidar com as críticas e ataques de adversários, principalmente em situações de pressão, como costuma a acontecer em debates políticos.

Foi inclusive em um confronto de candidatos à prefeitura do Rio de Janeiro que Flávio, então postulante ao cargo, acabou passando mal durante o debate em 2016.

Sobre o desempenho do pai, o deputado disse que Jair “mandou muito bem” no encontro presidencial deste ano. “Ele estava calmo e conseguiu explicar suas propostas”, resumiu.

(Karen Lemos - Portal da Band)

Bruno Covas diz que adversários tem "ciúmes" das alianças de Alckmin

Karen Lemos/Portal da Band

Coordenador da campanha de Geraldo Alckmin (PSDB) em São Paulo, o tucano Bruno Covas rebateu as críticas dos adversários do presidenciável durante o debate que a Band realizou nesta quinta-feira, 9.

Alguns candidatos atacaram a grande quantidade de partidos que fecharam acordo com a campanha tucana. “Isso aí é ciuminho”, ironizou o prefeito da capital. “Eles estão com ciúmes, afinal, quem não queria uma coligação dessa?”

Após várias negociações, Alckmin conseguiu apoio com os partidos do chamado Centrão - PP, PR, PRB, DEM e Solidariedade -, além de PTB, PPS e PSD, fechando uma superaliança que lhe garante, por exemplo, maior tempo de rádio e TV no horário eleitoral.

Bruno Covas afirmou ainda ter ficado “contente” com o desempenho de Alckmin no debate. “Ele conseguiu demonstrar tudo o que já fez pelo governo de São Paulo, quando foi governador do Estado, e também soube expor o que ele propõe fazer pelo Brasil”, acrescentou o coordenador da campanha.

(Karen Lemos - Portal da Band)

Boulos compara Bolsonaro a Chihuahua: 'é só bater o pé que sai correndo'

Kelly Fuzaro/Band

Posicionado ao lado de um de seus adversários políticos, Guilherme Boulos (PSOL) disse que não se sentiu ameaçado por Jair Bolsonaro (PSL) durante o primeiro debate entre presidenciáveis realizado pela Band nesta quinta-feira, 9.

“O Bolsonaro que acha que mete medo nas pessoas, mas sabe aquele cachorrinho Chihuahua, que grita, fica na sua canela, mas quando você bate o pé sai correndo? É mais ou menos por aí”, ironizou o candidato que teve momentos de trocas de farpas e discussões acaloradas com o adversário durante o debate.

Para Boulos, ele e Ciro Gomes (PDT) eram os oposicionistas do atual governo de Michel Temer (MDB) naquele momento. “Todos os outros, os 50 tons de Temer, vieram dizer que são renovação, mas todos eles ajudaram a botar o Temer onde está", disse, fazendo um trocadilho com o livro "50 Tons de Cinza".

O presidenciável do PSOL ainda falou de Lula (PT), que não compareceu por estar preso em Curitiba. “Ele deveria ter o direito de apresentar sua candidatura, até porque foi condenado de maneira injusta”, pontuou.

Guilherme Boulos, que tem pouco tempo de rádio e TV, celebrou a oportunidade de apresentar suas ideias no debate. “Deu para deixar claro que nossa candidatura não é a velha politicagem da qual as pessoas já estão cansadas. Ela vem da rua, de baixo para cima. Estamos com os 99% da população brasileira que sofre todos os dias, não esse 1% que os outros candidatos representam, dos banqueiros e empresários”, concluiu.

(Karen Lemos - Portal da Band)

Cabo Daciolo celebra sucesso na web: 'é o vento do espírito santo soprando'

Kelly Fuzaro/Band

Surpresa do debate da Band, o candidato Cabo Daciolo (Patriota) comentou a repercussão que ganhou, principalmente nas redes sociais, no primeiro encontro entre presidenciáveis realizado nesta quinta-feira, 9.

“Como diz a palavra, Deus não constrói uma casa no alto do monte para que ela não seja vista”, afirmou o candidato sobre seu inesperado destaque no encontro dos postulantes ao cargo.

“Essa foi a primeira oportunidade que eu tive para apresentar minhas propostas à nação e nós vamos transformar a colônia brasileira em nação brasileira”, pontuou.

Daciolo, que atribuiu a Deus seu sucesso na internet, se mostrou grato. “Eu quero agradecer o carinho de todos. Sou um cara simples, que tem um telefone simples, mas eu creio que esse mover, esse agir, esse vento é o vento do espírito santo soprando.”

Para o candidato, as áreas no País que merecem atenção são educação e combate à corrupção, mas que também pretende investir no combate à impunidade no Brasil, "que é grande", segundo ele.

"Todos que estão aqui representam a velha política, e ainda têm a cara de pau de chegar aqui e tentar enganar o povo novamente”, afirmou sobre seus adversários no debate.

Daciolo acrescentou que não está na política para enriquecer. “Quero provar que é possível estar no meio dos lobos, sem se tornar um lobo. Para a honra e a glória do senhor Jesus, vamos transformar essa nação.”

(Karen Lemos - Portal da Band)

quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Debate terá mais confrontos diretos entre candidatos à Presidência, adianta Boechat

Divulgação/Band

Novamente na função de mediar o debate eleitoral na Band, o jornalista Ricardo Boechat diz estar ansioso para o primeiro encontro entre os candidatos à Presidência da República deste ano, que acontece nesta quinta-feira, 9, às 22h, em clima de comemoração. “É um simbolismo grande para a história da democracia brasileira, especialmente a recente, afinal já são 30 anos de debates entre candidatos à Presidência”, lembra.

O jornalista recordou o encontro realizado entre dois pré-candidatos ao Palácio do Planalto, Leonel Brizola e Paulo Maluf, em 1988. “[Esse evento] teve uma repercussão muito grande, o Brasil nunca tinha visto um debate político na TV com essa proposta desde que saímos de um longo período de regime de exceção. Esse também foi o primeiro passo para, no ano seguinte, em 1989, apresentarmos o debate entre candidatos já oficializados pelos seus partidos.”

Para Boechat, cada um dos debates nesses 30 anos foi fundamental para dar largada às campanhas presidenciais, com características que se aprimoram a cada encontro. “Eu chamaria atenção para a mais enfática delas que é a de ampliar o confronto direto entre os postulantes ao cargo”, ressalta o jornalista.

Este ano, haverá mais chances de um candidato fazer perguntas para seu adversário, o que deixa o confronto muito mais rico, na opinião do mediador. “O debate desta quinta avança em um processo que dá mais espaço para esse confronto direto. Se antes, em um período inicial, isso se dava com perguntas feitas por jornalistas ou pelo público, agora, cada vez mais, se transforma em questões feitas de um candidato para o outro”, diz Boechat. “E ninguém tem mais interesse de colocar questões difíceis ao outro senão seu adversário. Essa é a melhor forma de estimular um confronto franco.”

E serão muitos os confrontos - até 64 vezes, entre respostas, réplicas e tréplicas para os oito candidatos que confirmaram presença no evento. A quantidade de postulantes, na visão do jornalista, só vem a acrescentar ao jogo político. “O melhor debate é aquele que tem menor participação do mediador, pois isso significa que o protagonismo dos candidatos foi maior. Não vejo no grande número de participantes uma dificuldade profissional, apenas fica mais complexo do ponto de vista de fragmentação de tempo, mas a Band tem experiência nisso.”

Também são esperadas algumas trocas de farpas nesse encontro devido à polarização política que vem se desenhando desde que os nomes dos primeiros pré-candidatos à Presidência surgiram, e que se consolidou após a oficialização dos postulantes nas convenções partidárias. Para o jornalista, essa situação é excelente para que o eleitor forme sua opinião.

“Esse é o momento de ver os candidatos expostos, desnudos de seus protocolos. Se em um debate eles agem de determinada forma sob pressão, como reagirão enquanto principais mandatários do País? É uma ótima forma de avaliação e ajuda o eleitor a produzir um voto mais consciente”, analisa.

Citando pesquisas de intenção de voto, que mostram uma porcentagem muito alta de eleitores indecisos, ou que pretendem anular o voto ou votar em branco, Boechat também acredita que o debate desta quinta pode reduzir, de forma significativa, esses números.

“Teremos uma eleição com alto nível de participação do eleitorado”, afirma. “O brasileiro está interessado na política como jamais esteve. As pesquisas também mostram que mais de 80% entendem que o voto é um instrumento fundamental para o processo democrático. As pessoas têm consciência da relevância desse momento e devem exercer esse direito amplamente nessas eleições”, conclui.

(Karen Lemos - Portal da Band)

sexta-feira, 15 de junho de 2018

Da luta contra ditadura à camisa 'coxinha' da CBF: como a política influencia a torcida na Copa

Nos protestos contra a presidente Dilma, em 2016, muitos usaram a camisa da CBF (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

Marcos Alvarez tinha apenas 7 anos em 1970, mas lembra-se muito bem de um costume de sua família naquela época: não torcer pela Seleção Brasileira nas Copas do Mundo. Apesar da pouca idade, quando garoto Marcos gostava de ouvir os debates políticos que permeavam as reuniões familiares; discussões que enalteciam as ideias de esquerda e rechaçavam o então governo, naquela época comandado pelo general Médici, no auge da repressão da ditadura militar.

“Minha família, que sempre foi de esquerda, tinha essa coisa de não torcer pelo Brasil por causa da ditadura, que naquela época havia abraçado a Seleção Brasileira”, lembra Alvarez, hoje professor universitário e torcedor da Inglaterra. “Eu me lembro de um dos primeiros jogos que assisti, Brasil e Inglaterra na Copa de 70, e gostei muito dos ingleses; até hoje é a seleção pela qual eu torço”, diz ele ao Portal da Band.

A relação entre o então regime militar e a Confederação Brasileira de Desportos (CDB), hoje Confederação Brasileira de Futebol (CBF), nunca foi muito clara, mas alguns indícios chegaram a levantar suspeitas de sua existência, como a troca do técnico João Saldanha, militante do PCB (Partido Comunista Brasileiro), por Zagallo pouco antes de a Seleção desembarcar no México, de onde sairia com o título.

“Existia um acordo racional, entre aqueles que combatiam diretamente o regime, de não torcer pela Seleção por achar que isso favoreceria o governo”, lembra Cláudio Zaidan, comentarista esportivo da Rádio Bandeirantes. Esse sentimento foi potencializado após a mudança de técnico, que preocupou a militância que lutava contra a ditadura na ocasião. Segundo Zaidan, não é possível afirmar, porém, que essa troca se deu por razões estritamente políticas.

“Nos amistosos, [antes da estreia na Copa de 70], a Seleção caiu de rendimento e, para o governo, era interessante ter o time indo bem; se Saldanha continuasse com os bons resultados que apresentou nos jogos eliminatórios, o fato de ele ser comunista talvez fosse tolerado”, ressalta o comentarista.

Para o professor Marcos Alvarez, porém, a situação do país foi determinante em outras Copas também, pelo menos em seu círculo de amigos. “Na Copa de 1982, eu tinha uma amiga na faculdade que admirava Leon Trotsky [intelectual marxista da antiga União Soviética] e torcia contra o Brasil na esperança de que a Seleção perdesse e isso despertasse algo que acabaria em uma revolução no País”, lembra. “Sempre achei isso meio ingênuo, mas até hoje alguns grupos políticos fazem essa vinculação mais direta com o futebol.”

A Copa do Mundo de 2014, que aconteceu no Brasil, é outro exemplo dessa influência política na percepção do evento pelos brasileiros. Antes de seu início, protestos ganharam as ruas pelo País contra gastos para sediar o Mundial em meio a uma recessão econômica com consequências que perduram até hoje. A frase “não vai ter Copa” marcou a ocasião.

“Quando o País está deprimido emocionalmente, [quando] há um desgaste, uma depressão e descrença no Estado e nas instituições, muita gente acaba enxergando a Seleção como uma expressão de tudo isso, até porque o torcer é emocional, não é uma coisa racional”, pontua Zaidan.
Como exemplo mais atual, o comentarista esportivo cita ainda o uso da camisa da CBF nas manifestações pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT). “Agora [a camisa] é vista como uma posição política, embora ela seja usada por décadas sem nenhuma associação do tipo. Mas, como o debate político no Brasil não é profundo, sempre estamos sujeitos a esses simbolismos frágeis.”

Uma camisa para torcer

Frágil ou não, o símbolo que se tornou a camisa da CBF após os protestos pelo impeachment de Dilma afetaram a relação de Viviane Cubas com a Copa do Mundo. “Diferente de outras Copas, essa é a primeira em que eu não comprei nada [para torcer] e não organizei nada para assistir aos jogos”, relata. “E um pouco disso é devido ao momento de crise política que estamos vivendo. Uma vitória do Brasil pode significar um ponto positivo para o governo, uma apropriação maior desse símbolo que hoje, para mim, remete às manifestações. Se antes era uma camisa que me dava orgulho, agora eu olho e me sinto mal.”

Viviane não está sozinha nessa posição. Pela internet, principalmente nas redes sociais, camisas alternativas estão sendo oferecidas para quem quer torcer, mas não quer vestir a camisa da CBF. “Acho muito bacana ter opções para quem quer torcer, embora também considere arriscado usar algumas camisas, porque há pessoas que ficam agressivas quando encontram alguém com posições políticas contrárias, mas, em nome da liberdade de expressão, tudo é válido”, observa Vivi.

Foi para torcer, e também para protestar, que Aline* decidiu confeccionar camisas especiais para esse Mundial. A peça mistura a criação da designer Luísa Cardoso, que elaborou a camisa vermelha com o escudo da CDB de um lado e, do outro, um dos símbolos do Comunismo, a foice e o martelo, com a frase “é golpe no Brasil” na parte de trás.

Foto: Arquivo pessoal

“A ideia começou em uma mesa de bar com amigos. Queríamos curtir a Copa, mas por causa do estigma deixado pelos protestos pelo impeachment - cujo resultado não concordamos -, ninguém queria usar a camisa da CBF e isso causou um desânimo geral”, contou Aline, que não quis se identificar depois que a CBF notificou a designer Luísa Cardoso sobre a proibição da venda de produtos que levem o nome da instituição.

Para “animar” essa torcida, ela formou um grupo nas redes sociais para receber pedidos dos amigos, e de amigos desses amigos, e passou a confeccionar a camisa para quem estiver interessado. A demanda, porém, cresceu de forma inesperada. “Criei esse grupo há quase duas semanas e já recebi 110 pedidos”, conta. Aline, que já trabalhou com estamparia, não lucra com a produção das camisas, que é feita por uma empresa do ramo. “Eu só repasso a demanda para eles e entrego as camisas para quem comprou. Sou apenas a ponte.”

Uma das “clientes” de Aline, inclusive, está indo para a Rússia neste sábado, 16, a tempo de ver a estreia da Seleção Brasileira, no jogo contra a Suíça no domingo, 17, com a camisa vermelha.

Outra camisa que tem atraído os torcedores que não concordam com as manifestações do impeachment incluem as cores verde e amarelo, mas em vez do escudo da CBF traz a frase “é golpe” como se fosse um grito de “gol” estampada. A bióloga Bruna de Oliveira foi uma das que adquiriram a peça pela internet.

Foto: Reprodução

“Eu sempre gostei da Copa por causa do clima que contagia as pessoas e pelos eventos que acontecem para assistir aos jogos; também gosto do tema verde e amarelo que toma conta do País nessa época, mas está difícil usar a camisa da CBF por aí. Eu não quero correr o risco de ser confundida com alguém que está pedindo intervenção militar ao invés de estar torcendo pela Seleção”, diz Bruna à reportagem. “Quando eu vi essa camisa, achei a ideia genial e mandei fazer, com algumas amigas. Dessa forma, a gente não vai deixar de curtir a Copa esse ano.”

* Nome alterado a pedido da fonte

(Karen Lemos - Portal da Band)

sábado, 9 de junho de 2018

Ilha guarda segredos de aliança entre Brasil e a Alemanha Nazista

Membros do Partido Nazista no Brasil (Foto: Reprodução)

O cenário paradisíaco de São Francisco do Sul, no litoral de Santa Catarina, pouco combina com as atrocidades de um regime tirano. A ilha, no entanto, esconde vestígios da boa relação com o Brasil e a Alemanha Nazista às vésperas da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Naquela ocasião, nazistas estiveram no país e negociaram a construção de uma estrada e de uma base militar no município com aval do governo de Getúlio Vargas, que somente no fim da guerra enviou tropas brasileiras para combater a Alemanha no conflito mais letal da História.

A ilha ainda guarda vestígios desta relação pouco conhecida, mas cujas consequências perduram até hoje, causando prejuízos ao meio ambiente e também à população de São Francisco do Sul, como mostra uma série de reportagens de Sandro Barbosa, do Jornal da Band.

As obras e os danos que sobrevivem ao tempo

Uma das consequências desta aliança entre Brasil e a Alemanha Nazista só é possível ver do alto, mas os impactos são sentidos pelos moradores da ilha até hoje. Em São Francisco do Sul, o regime de Adolf Hitler realizou obras de aterro do Canal do Linguado para a construção de uma linha de trem e de uma estrada - a BR-280 - que serviria para escoar material bélico em troca da instalação de uma montadora alemã de veículos.

A linha de trem e a estrada cruzam a Baía da Babitonga, um santuário ecológico formado por 24 ilhas, onde centenas de espécies encontram refúgio para se reproduzir. Por meio de um decreto, Vargas autorizou as obras de aterro e a ligação com o mar foi interrompida.

Foto: Reprodução

Imagens aéreas mostram que a construção provocou um grande dano ambiental: de um lado da baía, há água; do outro, entretanto, apenas barro e sujeira, impedindo a reprodução de espécies e também a atividade de pescadores que antes trabalhavam na região.



A ilha estratégica


Além da linha de trem e da estrada, os nazistas também ergueram em São Francisco do Sul uma base militar para que navios e submarinos alemães recebessem combustível e armamento.

Fotos da época mostram, inclusive, dirigíveis alemães sobrevoando o lugar onde seria construída a base militar, mais especificamente na ilha de Rita, que pertence ao município. Por lá, ainda é possível ver dutos, embora já enferrujados pela ação do tempo, que revelam planos da Alemanha Nazista para abastecer sua frota naval.

Em outra imagem de arquivo, o então presidente Getúlio Vargas foi fotografado na ilha de Rita, deixando clara a sua importância estratégica. Vargas esteve algumas vezes no local, visitando as obras e examinando as instalações, concluídas em 1940.

Foto: Reprodução

“Há muitos indícios provando que havia uma relação política amistosa entre Vargas e o regime nazista como, por exemplo, cartas entre Vargas e Adolf Hitler em que o brasileiro chamava o ditador de ‘bom e fiel amigo’”, conta a professora Ana Maria Dietrich, que estudou essa aliança durante 20 anos.


Os impactos e o pedido de reparação


Os projetos nazistas no Brasil, principalmente o aterro do canal do Linguado, trouxeram impactos no meio ambiente e também para os moradores da ilha. O fechamento da ligação com o mar aumentou também a concentração de dejetos da indústria, que tem forte presença na região.

Ao logo dos anos, muito material tóxico, como metais pesados, foi depositado dentro do estuário sem o tratamento prévio. “Alguns ensaios demonstram concentrações de cádmio, zinco, cobre, chumbo, mercúrio, manganês, e esses elementos começam a trazer problemas para as pessoas, principalmente as que se alimentam de peixes e crustáceos daqui”, explica Tarcísio Possamai, professor de geologia marinha.

O vice-prefeito de São Francisco do Sul, o médico pediatra Walmor Berreta Júnior, diz que está preocupado principalmente com a incidência de câncer. “Existem estudos científicos comprovados de referência internacional dizendo que isso aí realmente acarreta malefícios à saúde, principalmente do ponto de vista oncológico [câncer].”

Um grupo multidisciplinar - formado pelas universidades de São Paulo (USP), a Federal do ABC (UFABC), a Univille e a Universidade de Oregon, nos Estados Unidos, além da Procuradoria Geral da República, a Advocacia Geral da União e a prefeitura de São Francisco do Sul – tenta mudar este cenário e cobra do governo alemão a reparação do desastre ambiental.

“O fechamento do canal do linguado foi em 1933, portanto, 85 anos já se passaram e nada foi feito. O que a gente pretende agora é, quem sabe, mudar essa realidade de forma que a gente possa dar às futuras gerações uma condição melhor de saúde e de ambiente”, ressalta Renato Gama Lobo, prefeito do município.

Até hoje, o governo alemão só considerou indenizar atos que feriram os direitos humanos e foram cometidos contra pessoas e propriedades, mas nunca um desastre ambiental como crime de guerra.

“Se eles não reconhecerem sua responsabilidade, São Francisco do Sul, Santa Catarina e o Brasil vão encontrar meios no direito internacional para solucionar uma controvérsia que existe, que é a falta de cooperação dos alemães para nos ajudar a encontrar uma solução para um problema que eles também são responsáveis por terem causado”, acrescenta a professora de direito internacional Maristela Basso.

O objetivo é aproveitar que o governo federal pretende duplicar a BR-280 para reabrir o canal do linguado, sem contaminar ainda mais as águas.


Em nota, o consulado da Alemanha no Brasil informou que o aterro do linguado foi uma decisão do governo brasileiro e que a obra ocorreu em data consideravelmente anterior à Segunda Guerra Mundial e com a finalidade de fornecer produtos para uma fábrica de armamentos brasileira. Por isso, é completamente claro que a responsabilidade fica somente com as autoridades brasileiras.

(Karen Lemos - Portal da Band)

sexta-feira, 8 de junho de 2018

Orquídea ajuda prevenção em região de maior incidência de câncer de útero

Agentes de campanha de saúde levam a flor para mulheres em comunidades do Pará (Foto: Divulgação)

Uma orquídea está servindo como um importante lembrete na prevenção do câncer de colo de útero para mulheres da região Norte do Brasil, onde o risco estimado para a doença é 60% mais alto do que no resto do País.

Adaptada para o clima da região amazônica, a planta floresce a cada 12 meses, avisando que é hora de realizar o Papanicolau, exame responsável por detectar lesões que podem evoluir para este tipo de câncer.

Com a ação, agentes de saúde esperam reduzir a incidência da doença, que é de 25,62 casos a cada 100 mil mulheres na região Norte. Em todo o Brasil, o risco estimado é de 15,43/100 mil, segundo relatório do Instituto Nacional de Câncer (INCA). Para a enfermeira epidemiologista Maria Beatriz Kneipp, a discrepância de porcentagem está relacionada a uma somatória de fatores.

“A região Norte tem uma característica diferenciada do resto do País. Tem a questão da extensão de densidade demográfica e também de nível educacional mais baixo. O câncer de colo de útero também está relacionado com os problemas de desenvolvimento socioeconômico da região, que pode ser visto, por exemplo, na dificuldade das mulheres em ter acesso ao exame”, explica a especialista ao Portal da Band.

A última pesquisa nacional sobre o tema, elaborada em 2013, mostra que o percentual de mulheres que fazem o exame Papanicolau regularmente na região é de 75%; outras 12% relataram jamais ter realizado a avaliação médica. “Dessas mulheres, algumas disseram que não acharam necessário fazer o exame, outras afirmaram ter vergonha e teve ainda quem respondeu nunca ter sido orientada a fazer o Papanicolau. É preciso, então, identificar e trabalhar essas questões que aumentam os riscos da doença”, acrescenta Kneipp.

Flor da Vida

Foto: Divulgação

Com base nesses dados que preocupam as autoridades de saúde, foi criada a campanha Flor da Vida, idealizada pela Ogilvy Brasil para o Hermes Pardini com apoio da Secretaria da Saúde do Governo do Pará. Três mil agentes de saúde, envolvidos no projeto, se dividem na entrega das flores, na promoção de eventos e de aulas educativas sobre o tema.

A orquídea usada na ação é um híbrido de cattleya, desenvolvida pelo orquidófilo Sergio Barani, que tem mais de 50 anos de experiência na área. “Através de cruzamentos, conseguimos criar esse híbrido que floresce uma vez por ano, alertando as mulheres que chegou a hora de fazer o exame ginecológico. Também será possível reproduzir [a orquídea] aos milhares por clonagem”, diz Barani no vídeo institucional da campanha.

Foto: Divulgação

Apesar do ciclo de 12 meses da planta, o exame de Papanicolau pode ser realizado em até três anos, com exceção de mulheres que têm problemas de imunidade, como portadoras do vírus HIV, que precisam fazer a avaliação médica anualmente.

Infraestrutura regional e tratamento da doença


O foco da campanha Flor da Vida está justamente na prevenção por ser a forma mais efetiva de reduzir a incidência do câncer de colo de útero. O exame Papanicolau pode ser realizado em qualquer centro de saúde. Há, inclusive, unidades fluviais que atendem comunidades mais afastadas. “Esse exame identifica lesões pré-malignas que podem ser retiradas em um ambulatório sem nem precisar de internação. A lesão é removida e a mulher vai para casa no mesmo dia”, esclarece a epidemiologista Maria Beatriz Kneipp à reportagem.

Já os procedimentos médicos para combater o câncer já evoluído implicam em uma logística bem mais complicada. “Para um tratamento com quimioterapia ou radioterapia, a paciente pode ter que se dirigir até outra cidade. Em alguns Estados, como Amapá ou Roraima, esse tipo de tratamento é feito só nas capitais”, ressalta. “Existe, portanto, essa preocupação com o deslocamento e também com a realidade de algumas mulheres, que têm casa e filhos para cuidar e nem sempre conseguem fazer o tratamento até o final.”

Mesmo sendo um tipo de tumor com potencial alto de prevenção e cura, principalmente se diagnosticado precocemente, o câncer de colo de útero matou 800 mulheres na região Norte em 2016 segundo dados do Ministério da Saúde. Para Kneipp, é possível diminuir os números de mortalidade e também de casos em que o câncer se desenvolve.

Na região Sudeste, por exemplo, a incidência desse tumor é de 9,97 a cada 100 mil mulheres. “Vemos, portanto, que é possível reduzir os riscos para a doença e, por essa razão, tentamos sempre buscar alternativas e estratégias com esse propósito”, conclui a especialista.

(Karen Lemos - Portal da Band)

quarta-feira, 18 de abril de 2018

Família pede liberação de artista circense preso em operação contra milícia

Foto: Arquivo pessoal

Artista circense com carreira internacional, Pablo Dias Bessa Martins encontra-se longe do picadeiro, onde costuma a chamar atenção pela presença de palco e habilidade nos malabares e acrobacias. Atualmente ele está preso no Complexo Penitenciário de Gericinó (Bangu), para onde foram transferidos os detidos de uma megaoperação da Polícia Civil do Rio de Janeiro contra milicianos.

Além de Pablo, outras 158 pessoas foram presas no último dia 7 em um show de pagode que aconteceu em Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio. Segundo a polícia, o evento foi organizado por um grupo de milicianos que utilizava o local como uma espécie de quartel general. Testemunhas dizem, porém, que o show era aberto ao público, foi divulgado pelas redes sociais, e muitos dos alvos não têm ligação comprovada com a milícia.

“O Pablo nunca se envolveu com coisa errada. A comunidade em peso conhece o trabalho dele, sabe da sua índole. [A prisão] foi como um soco. Todo mundo está indignado”, relata Jessica, mulher de Pablo, em entrevista ao Portal da Band.

Assim como o marido, Jessica é artista de circo. Eles se conheceram nas oficinas de artes circenses da Acaps (Ação Comunitária de Apoio Psicossocial), organização não-governamental que oferece também oficinas de dança, capoeira e reforço escolar para jovens de comunidades do Rio de Janeiro.

Foi lá que Pablo teve sua formação artística e, como retribuição, atuou como professor voluntário em algumas ocasiões. “Quando volta para o Brasil, após temporadas de apresentações na Europa, ele traz materiais caríssimos, como malabares, pernas-de-pau, monociclo, e doa para o projeto. Ele também ministra aulas e compartilha suas experiências com nossos alunos, que têm o Pablo como um exemplo, uma referência positiva na comunidade”, conta Jonathan Rodrigues, presidente da Acaps e amigo de infância.

Além da ONG, Pablo também fez capacitação profissional na Unicirco, projeto do ator Marcos Frota, que, segundo Jonathan, abriu as portas para uma atuação no exterior. Atualmente, o artista é contratado pela Up Leon, companhia brasileira que tem parceria com empresas que organizam espetáculos na Alemanha, Finlândia e Suécia, país para onde o brasileiro tem viagem marcada no próximo dia 24 para mais uma temporada de apresentações. Familiares e amigos de Pablo temem que a prisão impeça que ele viaje e cumpra sua agenda profissional.

30 minutos de troca de tiros

Foi para comemorar o sucesso na carreira, e também para marcar a despedida antes de mais uma temporada fora do Brasil, que Pablo, sua mulher, um primo e amigos foram ao show de pagode em Santa Cruz. “A gente viu a propaganda desse evento no Facebook e resolveu ir para celebrar a viagem dele”, lembra Jessica. Por volta das 3h, relata ela,  teve início uma confusão e troca de tiros no portão do local. “Foram uns 30 minutos de tiro”, disse.

“Depois, chegaram policiais se identificando, falando de uma denúncia sobre pessoas armadas no local. As mulheres puderam sair, mas os homens tiveram que ficar. Disseram que eles seriam encaminhados para a Cidade da Polícia só para uma averiguação de antecedentes criminais. Como o Pablo não tem passagem pela polícia, eu nem me preocupei. Fui para casa e fiquei esperando. Até hoje, ele não voltou”. O primo de Pablo e um amigo dele também foram presos.

Foto: Polícia Civil do Rio de Janeiro

Jessica chegou a levar documentos e o contrato do marido com a Up Leon na Cidade da Polícia, mas, segundo seu relato, foi ignorada. Mesmo após a transferência para Bangu, ela ainda não conseguiu contato com ele.

Habeas corpus indeferido

O defensor público Ricardo André de Souza tentou tirar Pablo Martins da prisão, mas o habeas corpus do artista circense, bem com de outros 21 clientes, foram indeferidos. “O caso dele conta com uma farta documentação que não só comprova o vínculo de prestação de serviços em uma agência de artistas como também faz link com um trabalho em outros países”, conta o defensor à reportagem.

Souza tem outros casos bem parecidos com o de Pablo nas mãos. “Diversos outros detidos comprovam vínculo empregatício e nenhum antecedente criminal. Há motoristas de ônibus, vendedores de loja, garis e até professor universitário.”

O defensor aguarda uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o habeas corpus de um de seus clientes para analisar o que poderá ser feito agora. “Dependendo da postura da Corte, vamos levar os outros habeas corpus para lá. Se não der resultado, o próximo passo é ir para o Supremo Tribunal Federal (STF)”, explica.

De acordo com informações da Polícia Civil na época da operação, os presos desse caso respondem pelos crimes de constituição de milícia privada e porte de arma de fogo de uso restrito. Na operação, foram apreendidas ainda 24 armas (fuzis, pistolas e revólveres), granada, 76 carregadores e 1.265 munições, além de 11 carros roubados. Na troca de tiros, quatro pessoas morreram.

O Portal da Band tentou contato com a Polícia Civil para esclarecimentos do caso Pablo Martins. Até o fechamento desta matéria, não houve resposta.

Febre e perguntas sobre o pai

Nos primeiros dias após a prisão de Pablo, seu filho de dois anos teve uma forte febre. “Levei ele para ser examinado e a médica disse que ele não tinha nada. Quando contei o que tinha acontecido, a doutora me explicou que poderia ser emocional”, recorda Jessica.

Foto: Arquivo pessoal

Embora Pablo fique meses fora do país a trabalho, a ausência do pai tem sido percebida de forma diferente pelo menino. “Ele não para de perguntar pelo Pablo. Ele fala ‘cadê o papai para brincar de circo comigo?’ Eu digo que ele está trabalhando, não consigo contar a verdade, até porque toda essa história é injusta, mentirosa. Mas acho que no fundo ele entende o que está se passando, e isso me dói muito. O Pablo é uma grande referência para nosso filho.”

“Eu só espero que meu marido saia limpo desta situação, que reconheçam que foi um erro prender ele. Quero meu marido sem manchas em sua dignidade, e livre para ir e voltar de qualquer país que ele quiser ou precisar. Lá fora ele sempre foi muito bem tratado. Não é justo que ele passe por toda essa humilhação no país onde nasceu”, lamenta.

(Karen Lemos - Portal da Band)

quarta-feira, 4 de abril de 2018

Prisão iminente, voto misterioso e impacto no Judiciário rodeiam julgamento de habeas corpus de Lula no STF

Foto: Ricardo Stuckert

O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quarta-feira (4), a partir das 14h, o julgamento do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), condenado a 12 anos e 1 mês de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso tríplex do Guarujá.

Na sessão anterior, interrompida devido ao horário avançado, a Suprema Corte concedeu salvo-conduto garantindo a liberdade do petista até a apreciação desse habeas corpus. Isso impediu que Lula fosse preso em março, quando o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) rejeitou os embargos de declaração, recurso disponível na segunda instância.

Pelo entendimento do STF, um condenado em segunda instância já pode começar a cumprir sua pena. O julgamento desta quarta, porém, pode mudar essa jurisprudência e manter Lula solto, inclusive para se candidatar nas eleições deste ano.

Se os ministros rejeitarem o habeas corpus, no entanto, a possibilidade de o ex-presidente ser preso é iminente. “Nesse caso, o próprio TRF4 já pode mandar expedir a execução imediata da pena ou determinar que o juiz da primeira instância [Sérgio Moro] o faça”, explica o especialista em direito penal Rogério Cury ao Portal da Band.

“Existe, porém, a seguinte discussão: deve-se aguardar a publicação do acórdão [documento oficial com a decisão do STF] para mandar prender Lula? A publicação pode acontecer de forma célere, entre dois ou três dias, mas é possível que a ordem da prisão seja emitida antes mesmo que o acórdão saia”, detalha ainda.

Em um cenário no qual os ministros da Corte acatem o habeas corpus, Lula não pode ser preso antes do trânsito em julgado, ou seja, todos os recursos em todas as instâncias da Justiça precisam ser apreciados para que o condenado passe a cumprir sua sentença.

O voto misterioso

Foto: Nelson Jr./SCO/STF

Já dá para ter uma ideia do posicionamento que os ministros do Supremo Tribunal Federal terão no julgamento desta quarta. O placar, todavia, está bem dividido: cinco contra cinco. Se as previsões se consolidarem, o voto de desempate será da ministra Rosa Weber, cujo parecer da questão ainda é incerto.
“Em 2016, quando a Corte discutiu a questão, Rosa Weber foi contra o cumprimento de pena após a condenação em segunda instância. Entretanto, desde aquela data, ela julgou o habeas corpus de 58 condenados e acatou apenas um, o que pode indicar que ela possa mudar de posição”, elucida Rogério Cury.

A decisão alternativa

Ainda há, entretanto, uma terceira possibilidade. O ministro Dias Toffoli apresentou uma alternativa que pode prevalecer na sessão desta quarta. No julgamento de 2016, ele defendeu o cumprimento de pena após a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Alguns colegas de Toffoli, como Gilmar Mendes, por exemplo, têm indicado que podem seguir esse entendimento, chamado de voto médio.
Se essa for a decisão da maioria dos ministros, Lula pode respirar aliviado – ao menos por um tempo. “Os processos de recurso no STJ costumam a demorar, em alguns casos até anos”, relata Rogério Cury.

Vale ressaltar que a apelação ao STJ, conhecida como “recurso especial”, trata apenas da matéria técnica, e não das provas. “A Corte pode até alterar o tempo de pena, por exemplo, se houver um entendimento de que algum dispositivo de lei foi violado na fixação da sentença, só não pode ocorrer a reapreciação de provas.”

Os recursos ainda possíveis

Seja qual for o resultado do julgamento nesta quarta, e independentemente se Lula for preso ou não, a defesa do petista ainda tem algumas cartas na manga. Além do já citado recurso especial no STJ, os advogados podem recorrer também ao chamado recurso extraordinário, uma apelação apreciada pelo STF.
“Por este meio, os advogados do petista suscitam a tese de que a condenação de Lula afronta a Constituição, que estabelece a condenação após o trânsito em julgado. Se os ministros assim entenderem, há chances de o processo ser anulado, Lula ser solto e começar tudo de novo”, exemplifica Cury.

A defesa de Lula pode ainda pedir medida cautelar de efeito suspensivo da prisão, caso o petista esteja na cadeia, se algum desses recursos for admitido pelas respectivas Cortes.

Os impactos no Judiciário (e na Lava Jato)

Foto: Gil Ferreira/SCO/STF

A decisão do STF não vai impactar apenas no futuro penal e eleitoral de Lula, e também não somente nos presos da Operação Lava Jato, mas em todos os réus condenados em segunda instância que já cumprem sentença.
Isso não quer dizer que revogar a jurisprudência vai “estragar” a operação que ganhou popularidade no Brasil. “O que pode ocorrer é que os presos, tanto da Lava Jato como de qualquer outro processo, serão soltos, mas eles já estão condenados – isso não muda. Hora ou outra, se assim a Justiça entender, eles voltarão para a cadeia”, explica o especialista em direito penal.

Para Cury, uma coisa é certa: discutir novamente uma questão já debatida em 2016 cria um clima de apreensão no Judiciário. “O habeas corpus é um dispositivo de extrema importância, por isso está assegurado na Constituição. Entendo que é um recurso a ser preservado pois garante o direito à liberdade. Avaliar essa questão várias vezes, em tão pouco tempo, cria uma insegurança jurídica muito grande no país”, avalia por fim.

(Karen Lemos - Portal da Band)