domingo, 21 de dezembro de 2014

Filme 'A Entrevista' tem lançamento suspenso no Brasil


O filme "A Entrevista", estrelado por James Franco e Seth Rogen, teve sua estreia em circuito nacional, agendada para o dia 29 de janeiro, suspensa "até segunda ordem", informou a assessoria de imprensa da distribuidora Sony Pictures ao Portal da RedeTV!

Na quarta-feira (17), a Sony dos Estados Unidos já havia anunciado o cancelamento. "A Sony Pictures não tem planos futuros de lançamento para o filme", declarou um porta-voz depois que o estúdio recebeu ameaças de ataque terrorista caso o longa-metragem fosse lançado.

Em "A Entrevista", os personagens de James Franco e Seth Rogen vivem dois jornalistas recrutados em uma missão especial para assassinar Kim Jong Un, líder da Coreia do Norte.

Seu conteúdo causou a ira do governo norte-coreano que, segundo o jornal The New York Times, planejou ou encomendou um ataque de hackers que invadiram, roubaram e divulgaram informações sigilosas do estúdio, como salário de atores, roteiro de filmes inéditos e até e-mails com troca de ofensas. Segundo a "Variety", "A Entrevista" não deve ser lançado nem mesmo em formato DVD. O prejuízo do estúdio pode chegar, de acordo com o site The Wrap, a US$ 90 milhões - aproximadamente R$ 230 milhões.



Outro longa que promete causar polêmica, "Pyongyang", sobre um ocidental que trabalha na Coreia do Norte por um ano, também teve seu lançamento cancelado. O filme chegaria aos cinemas em março de 2015.

(Karen Lemos - Portal RedeTV!)

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Ex-Mutante Arnaldo Baptista expõe obras em São Paulo


Enquanto não consegue lançar um novo LP por conta de certas burocracias, Arnaldo Baptista está voltado para as artes plásticas. Com “Exorealismo”, uma exposição em cartaz até o dia 10 de janeiro na Galeria Emma Thomas, em São Paulo, o ex-integrante do grupo Os Mutantes voltou a mergulhar em uma paixão mais antiga que a música: a pintura.

"Desde criança tenho certa vocação para a pintura. Quando garoto, eu pintava meus cadernos do primeiro ano, mas não passou muito disso", recordou em conversa com o Portal da RedeTV! "Durante um tempo, as artes plásticas foram mais importantes do que a música porque, para fazer música, eu precisava de um piano, de um contrabaixo; era muito caro! Na pintura, com um lápis e um papel eu tinha quase a mesma coisa que Salvador Dalí, por exemplo", ressaltou.

Na exposição, Arnaldo exibe obras que embarcam em uma ousada tentativa de materializar o som plasticamente. A música continua presente, ainda que de forma mais simplificada. "Um quadro meu pode parar no Japão sem depender de línguas e gravadoras", observou o artista.

Sobre inspirações e seu estilo próprio de pintar, o ex-Mutante enfatiza que não segue regras. "Não tenho muito estilo. Às vezes, pego algum objeto como uma colher velha, um pedaço de sapato, um CD, uma ferramenta e grudo na tela e, a partir daí, começo minha pintura", revelou. "O que poderia ser um erro no quadro, passa a ser uma evolução".

Não são apenas obras recentes que estão expostas em “Exorealismo”. Arnaldo reuniu para a mostra quadros datados desde a década de 90. "Tem coisas lá que eu nem lembrava mais que tinha feito", riu.

Nova empreitada na música 

Enquanto nas artes plásticas Arnaldo Baptista aproveita o prestígio de seu talento, na música as coisas não andam tão bem assim.

Em conversa com a reportagem, o músico revelou que possui um LP já pronto - com 12 músicas selecionadas. Por conta de processos burocráticos com gravadoras, ele ainda não conseguiu lançar este novo trabalho. "Não tem data para sair [o LP]. Estou esperando".

Batizado de “Esphera”, com direito a capa desenhada por seu autor, o LP traz um lado embasado na crítica social. "Fala de fogo, fumaça, poluição, gasolina", tentou resumir Arnaldo. "Custou muito tempo para o homem aprender a fazer fogo. Agora ele precisa desistir dele, das coisas elétricas", completou.

(Karen Lemos - Portal RedeTV!)

sábado, 29 de novembro de 2014

Fotógrafa retrata opinião de moradores da Rocinha três anos depois da Pacificação


Moradora da Favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, antes, durante e depois da Pacificação, a fotógrafa norte-americana Margaret Day decidiu retratar a opinião da comunidade em que viveu, entre os anos 2011 e 2014, em um ensaio fotográfico batizado “The Residents Speak – Os Moradores Falam”.

Em entrevista a RedeTV!, Margaret disse que tomou a decisão de realizar este projeto após notar o abismo que existe entre a percepção das pessoas a respeito da vida nas favelas e da realidade que de fato acontece morro acima. "Eu sei como é estratificada a sociedade brasileira", declarou em conversa com a reportagem. "Eu sabia que essas opiniões seriam uma surpresa para quem vive na 'cidade formal'. A maioria das pessoas que conheço que não vivem em favelas não entendem a realidade delas".

Para o ensaio, Margaret fez a seguinte pergunta a 21 moradores da Rocinha. “Você prefere a Rocinha antes ou depois da instalação da UPP?”, referindo-se às instalações de Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) em 2011. Dos 21, 16 disseram que a vida piorou depois da Pacificação. "Hoje em dia aumentou a violência, roubo; está tendo estupro, todos os dias tem tiroteio na favela", afirma um dos moradores do ensaio. Apenas 5 avaliariam como positivo a chegada das UPPs.

"Eu concebi esse projeto no terceiro aniversário da pacificação da favela, é uma iniciativa que procura transmitir o sentimento que ouço regularmente das pessoas que moram aqui", contou a fotógrafa, que fez questão de manter no sigilo a identidade de seus personagens.

Na altura do rosto, os moradores seguram um cartaz que revelam uma opinião também compartilhada pela fotógrafa. "Muitas pessoas sempre discordam da minha opinião quando faço comentários positivos sobre a vida na Rocinha antes da pacificação; elas geralmente atribuem a minha percepção ao fato de ser estrangeira e portanto de não ser capaz de dar uma opinião equilibrada", explicou. "Não fiquei nada surpresa com o resultado. Em geral, é o que eu ouço ecoou a vida cotidiana na Rocinha".

Margaret chegou ao Brasil após pesquisar sobre a Favela da Rocinha na internet. A ideia era desenvolver um projeto de arte para crianças que vivem em favelas. Com o tempo, a comunidade a conquistou. "Como assistente social, fiquei ainda mais interessada em me conectar com as pessoas que vivem nas favelas do que visitar praias famosas", observou a fotógrafa, cujo interesse nas vidas nas favelas despertou curiosidade.

"As pessoas que moram no asfalto e outros estrangeiros sempre ficam surpresos com o meu interesse por essa comunidade e também porque eu gosto de morar aqui. Elas sempre me perguntam se a vida aqui era melhor antes ou depois da pacificação", completou Margaret, que agora responde a essa pergunta de forma surpreendente.

(Karen Lemos - Portal RedeTV!)

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Cineasta brasileiro celebra curta-metragem entre finalistas ao Oscar


Mauricio Osaki, diretor de “O Caminhão do Meu Pai”, recebeu com surpresa a notícia de que seu filme está entre os 10 finalistas para concorrer ao Oscar de melhor curta-metragem na mais notória premiação do cinema.

“Eu realmente não imaginava que iríamos chegar tão longe”, declarou em entrevista à reportagem. “Enquanto rodávamos o filme, em áreas remotas ao norte de Hanoi (capital do Vietnã), em pleno inverno, jamais podíamos prever esse tipo de reconhecimento. É um filme falado em Vietnamita, sem atores conhecidos, com uma temática incomum, mas que de certa forma traz uma relação universal, entre pai e filha. Eu fico feliz que o filme possa continuar rodando e trilhando longos caminhos”.

O curta se passa através do ponto de vista de uma menina que, ainda nova, descobre o mundo real ao participar de um dia de trabalho de seu pai, um caminhoneiro que recolhe cachorros e os leva para um abatedouro local. A carne de cachorro, vale lembrar, faz parte da cultura gastronômica do país.


“É tão gratificante ver o quão longe este filme foi. Já passamos pelos festivais mais importantes do mundo. É um filme que já rodou toda a Europa, Estados Unidos, America do Sul e Ásia… Eu fico orgulhoso pela equipe, pelos atores, pois todo mundo trabalhou muito pelo filme”, observou Mauricio.

A lista final dos indicados ao Oscar de melhor curta-metragem sai no dia 15 de janeiro. Já a cerimônia de premiação acontece no dia 22 de fevereiro de 2015.

“O Caminhão do Meu Pai”, primeira coprodução entre Brasil e Vietnã, nasceu durante aulas de direção na NYU (Universidade de Nova Iorque) e contou com a ajuda de outros brasileiros como o fotógrafo Pierre de Kerchove, a assiste de direção Flávia Guerra e a musicista Michelle Agnes.

Além deste curta, outra produção brasileira também está na corrida pela almejada estatueta dourada. “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”, de Daniel Ribeiro, foi escolhido pelo Ministério da Cultura para representar o Brasil na premiação. O longa concorre a uma vaga entre os indicados ao Oscar de melhor filme estrangeiro.

(Karen Lemos - Revista O Grito!)

sábado, 22 de novembro de 2014

Longa sobre Caio Fernando Abreu vence prêmio do público no Festival Mix Brasil


Para Sempre Teu, Caio F., de Candé Salles, foi agraciado pelo público com o coelho de ouro de melhor longa nacional na premiação do 22º Festival Mix Brasil – que contempla e dá espaço para a produção cultural LGBT – em noite de cerimônia realizada na capital paulista.

Baseado em um livro homônimo escrito por Paula Dip, amiga pessoal de Caio Fernando Abreu, o filme é o mais completo e sincero resgate de memórias do escritor gaúcho que nos dias de hoje virou uma figura cult das redes sociais. “Quando escrevi o livro, iniciei uma pesquisa e notei que havia uma enorme quantidade de material visual sobre o Caio que estava se perdendo”, recordou em entrevista a O Grito!.

Assim como escreveu o livro, Paula decidiu também assinar o roteiro do longa. A decisão de comandar esses projetos foi fruto de uma promessa firmada com Caio, no ano de 1983, em uma noite regada a bebidas e boas conversas na qual ficou decidido: quem morresse primeiro, contaria a trajetória do outro. “Fiz esse filme para manter viva a memória de Caio, como ele havia me pedido; ter recebido esse prêmio do público me deu uma sensação de missão cumprida”, afirmou, muito emocionada.


A escritora Paula Dip e o diretor Candé Salles

As imagens de arquivos encontradas durante a pesquisa para o livro é um dos pilares que compõe Para Sempre Teu, Caio F., que traz ainda entrevistas com familiares, colegas de trabalho e amigos (que eram muitos!) e também encenações de alguns de seus textos por atores famosos como Camila Pitanga, Mariana Ximenes, Cauã Reymond, Caco Ciocler, Fabio Assunção, Thiago Lacerda, entre outros.

A ideia era não se limitar somente à vida do autor, que por si só oferece um conteúdo riquíssimo, mas também explorar e mergulhar fundo em sua obra. “Foi através do texto que Caio me tocou e, dessa forma, virei seu fã. Portanto, nada mais justo do que dividir isso com o público”, ressaltou o diretor Candé Salles em conversa com a reportagem.

O público ainda premiou o curta estrangeiro Aban + Khorshid, que choca ao mostrar as leis que proíbem a homossexualidade no Irã, o longa estrangeiro E Agora? Lembra-me de Joaquim Pinto, sobre a luta do cineasta português Joaquim Pinto contra a AIDS, e o documentário Nan Goldin – Lembro do seu Rosto, a respeito da vida da fotógrafa nova-iorquina Nan Goldin.

Entre os curtas nacionais, um empate. Aceito, de Felipe Cabral, e A Ala, de Fred Bottrel – que dedicou o prêmio aos detentos da ala gay de uma prisão de Minas Gerais – levaram coelhos de prata para casa.

Outros destaques 

O júri técnico também premiou com o coelho de ouro o longa-metragem Gazelle – The Love Issue, sobre um conhecido transformista da noite de grandes cidades ao redor do mundo que, após perder o seu parceiro e contrair HIV, embarca em uma transformação de consciência em sua vida, e o curta-metragem Algum Lugar no Recreio, de Caroline Fioratti, sobre como adolescentes lidam com os primeiros sintomas de seus desejos sexuais.


“Filmei esse curta com muita dificuldade, pois ele se passa em um colégio católico e, embora a direção do colégio tenha aceitado, os pais dos alunos foram contra a ideia de fazer um filme com esse tema lá”, contou Caroline após receber o troféu. “No final, a gente venceu, porque os jovens do colégio lutaram por isso. Esse prêmio vai para a atitude desses adolescentes, cuja postura eu admiro”, completou a cineasta, que também levou o coelho de prata de melhor direção.

Os jurados ainda fizeram uma menção honrosa a Nova Dubai, de Gustavo Vinagre, exibido no Janela Internacional de Cinema de Recife deste ano, e deram a Quinze, de Maurílio Martins, o prêmio Canal Brasil de incentivo ao curta-metragem, além de reconhecerem o trabalho da atriz Karine Telles por sua interpretação no filme.

Confira todos os vencedores: 
Júri Popular 
Melhor Curta Estrangeiro: Aban + Khorshid de Darwin Serink (EUA)
Melhor Longa Estrangeiro: E Agora? Lembra-me de Joaquim Pinto (Portugal)
Melhor Documentário: Nan Goldin- Lembro do seu Rosto de Sabine Lidl (Alemanha/ Austria/Suiça)
Melhor Curta Nacional: “A Ala” de Fred Bottrel e “Aceito” de Felipe Cabral (empate)
Longa Nacional: “Para Sempre Teu, Caio F.” de Candé Salles (Brasil)
Prêmio Canal Brasil de Incentivo ao Curta Metragem (de R$ 15 mil): “Quinze” de Maurilio Martins
Prêmio Ida Feldman: Colby Keller

Premiados pelo Júri Técnico Competitiva Brasil de Curtas 
Melhor curta metragem nacional Troféu Coelho de Ouro 2014: “Algum Lugar no Recreio” de Caroline Fioratti
Melhor direção de arte: “Edifício Tatuapé Mahal” / Fernanda Salloum
Melhor Fotografia: “Flerte” de Dante Belluti
Melhor Roteiro: “Sobre Papéis”/ Pedro Paulo Andrade
Melhor Interpretação: “Quinze”/ Karine Telles
Melhor Direção: “Algum Lugar no Recreio”/ Caroline Fioratti
Menção Honrosa: “A Ala” de Fred Bottrel

Premiados pelo Júri Técnico Competitiva Brasil de Médias e Longas 
Melhor curta média/ longa nacional Troféu Coelho de Ouro 2014: “Gazelle – The Love Issue” de Cesar Terranova (Brasil / EUA / Polinésia Francesa)
Menção Honrosa: “Nova Dubai” de Gustavo Vinagre

(Karen Lemos - Revista O Grito!)

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Caco Ciocler estreia como diretor e desabafa: "problemas com direitos autorais foram frustrantes"


Caco Ciocler exibiu o documentário "Esse Viver Ninguém Me Tira", sua estreia como diretor, pela primeira vez em São Paulo em sessão para convidados no MIS na noite de segunda-feira (3). O filme, uma produção da Cine Group que chega as salas de cinema em 2015, já havia sido exibido no Festival de Gramado e no do Rio este ano.

Em conversa com o Portal da RedeTV, o ator falou dos desafios de retratar nas telas a história de Aracy de Carvalho Guimarães Rosa, esposa de Guimarães Rosa, que salvou dezenas famílias de judeus durante a Segunda Guerra Mundial.

"Eu tinha dois pilares para trabalhar nesse filme. Um deles era abordar a vida de Aracy como esposa de um grande escritor brasileiro, mas, por conta de problemas com direitos autorais, não pude falar do relacionamento deles", contou em entrevista. "Essa dificuldade foi frustrante, mas acabou sendo uma benção porque fatalmente colocaríamos Aracy como coadjuvante do Guimarães".

A impossibilidade forçou Caco a explorar melhor o segundo pilar - o do gesto de Aracy em facilitar a entrada de judeus ao Brasil. Nascida no Paraná, ela se mudou para a Alemanha em 1934, onde começou a trabalhar como chefe do setor passaportes do consulado brasileiro na cidade de Hamburgo. Mesmo correndo risco de ser pega pelo regime nazista, ela liberou vistos ao Brasil para judeus perseguidos pelo governo. "Acho que ela não tinha noção de que estava salvando aquelas pessoas e nem elas sabiam do que estavam escapando, já que a realidade dos campos de concentração não era divulgada. Mesmo assim, ela não economizou nesses pequenos gestos que geraram vidas", completou.

Com esse foco, foi possível colocá-la como protagonista absoluta - o que também não foi uma tarefa fácil. "Não tinha absolutamente nenhuma documentação sobre isso, era um pilar muito frágil. O filme acabou se tornando, então, uma busca sobre o que sobrou da existência dela e de como isso transformou outras existências, inclusive a minha", recorda o ator, que é judeu.

Com depoimentos de pessoas próximas a Aracy ou que tiveram sua vida modificada por conta de suas boas ações e com filmagens que mostram lugares por onde ela passou e viveu, "Esse Viver Ninguém Me Tira" documenta mais a ausência de Aracy do que ela própria. "Foi mais ou menos como a barbatana do 'Tubarão' de [Steven] Spielberg. A produção do filme não podia mostrar o tubarão porque ele era um robô muito bizarro. Aí alguém teve a ideia de mostrar só a barbatana, deixando o público criar o seu monstro", explicou Caco. "Tive que criar essa barbatana para o documentário, o que fez com que o filme deixasse de ser sobre a Aracy e acabou virando um retrato do arquétipo de um herói".

A estreia por trás das câmeras foi tão válida que Ciocler espera repetir a experiência em breve. "Me sinto mais preparado para dirigir novamente agora que aprendi com erros e ingenuidades. Já tenho um novo projeto, mas ainda não posso falar sobre isso", declarou o agora cineasta.

(Karen Lemos - Portal RedeTV!)

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Cinebiografia de Tim Maia mostra lado 'mesquinho' de Roberto Carlos


Chega aos cinemas, nesta quinta-feira (30), a cinebiografia de Sebastião Rodrigues Maia, mais conhecido como Tim Maia, que pretende trazer para as telonas um lado pouco conhecido não só do músico de voz grave e temperamento forte, mas também das personalidades que o rodeavam.

Chama a atenção, por exemplo, a presença de Roberto Carlos no longa-metragem como um sujeito que tenta conquistar a fama a todo custo e, já em seu auge, dá pouca atenção aos companheiros de início de carreira – como é o caso de Tim Maia, que cantou com Roberto no quarteto The Sputniks.

Esse lado, digamos, “mesquinho” do Rei não se tornou, no entanto, uma preocupação para o diretor de “Tim Maia – O Filme”, Mauro Lima. “Nada do que está no filme saiu da minha cabeça, foi tudo baseado na biografia de Nelson Motta”, esclareceu em entrevista coletiva concedida nesta segunda-feira (27) em São Paulo. “O Roberto, inclusive, leu e autorizou o roteiro. Não sei como ele vai reagir, mas ele conhece bem a história”.

“Temos que lembrar, também, que essa é a visão do Tim com relação ao Roberto”, completou o ator George Sauma, que vive o Rei no longa. “Mas, de fato, eu tentei fugir mesmo daquela imagem do Roberto de hoje em dia”.

Essa imagem, segundo Mauro, está muito pautada no cantor dos especiais de final de ano. “Assim como Tim, Roberto teve várias fases na carreira. Ele já foi, por exemplo, um rebelde da Jovem Guarda”, recordou o cineasta, que garantiu que não sofreu censura alguma para rodar o filme. “Não existiu um limite imposto, mas como se trata de um filme romantizado, tive que abrir mão de algumas coisas por se tratar de uma obra ficcional, caso contrário, eu estaria fazendo um documentário”.

O homem por trás das câmeras 

Para fazer uma cinebiografia que fugisse do óbvio, Mauro fez um recorte da vida e obra de Tim que pudesse ser nova e curiosa aos olhos do grande público. “De qualquer forma, ele tem uma biografia com muita vocação para um filme”, pontuou o cineasta. “Ele já foi preso, roubou carro e tudo o mais, fora o que ficou de fora para caber em um filme, senão teríamos que fazer uma série”.

Com esse viés, “Tim Maia – O Filme” foca mais na juventude de Sebastião (a adolescência no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, descoberta da música e das terras estrangeiras quando se muda para Nova York ainda jovem) e de sua carreira na década de 1970, passando pela fase da Cultura Racional – da qual ficou fascinado pela filosofia e que, após perder muito dinheiro, descobriu ser uma roubada e pulou fora – até seu “renascimento” com o álbum “Tim Maia Disco Club”.


Quem auxiliou nesse recorde foi o filho do cantor, Carmelo Maia, que também fez uma ponta no filme como um jornalista, entrevistando o ator que interpreta seu próprio pai. “É difícil tentar entender uma pessoa que você só vê para as câmeras”, pontuou Mauro. “Tim tinha uma personalidade muito clara quando a câmera estava ligada e nós só conhecemos esse material. Mas quem é o cara quando a câmera desliga? Quem é aquele cara na casa dele, tomando café da manhã com o filho? Ninguém registrou isso. Nesse ponto, precisei juntar informações e intuir algumas coisas. O Carmelo me ajudou muito nisso”.

Um artista, três faces 

As facetas de Tim Maia são tantas que, para dar conta, o diretor convidou dois atores para interpretá-lo. “Se você olhar para o Tim Maia em todas suas fases, ele aparece três pessoas diferentes”, explicou Mauro. 

Responsável por viver Tim no auge da carreira, Babu Santana parece ter nascido para esse papel. “Meu trabalho foi facilitado pela caracterização”, disse, de forma modesta, o ator. “Fiquei livre para pensar no lado emocional”. Babu também soltou a voz em algumas cenas, revelando talento e certa semelhança com o timbre raro de Tim.

Dando rosto à fase da adolescência e da descoberta musical, Robson Nunes está levando muitas coisas de sua experiência neste trabalho. “Ganhei quinze quilos a mais”, brincou. “Fora isso, interpretar um cara que fez o que quis em vida, te faz repensar alguns princípios. Faz você querer se permitir mais”, refletiu.


O elenco conta ainda com atuações de Alinne Moraes, esposa do diretor, que vive a personagem Janaína (um híbrido de dois amores na vida de Tim Maia), e Cauã Reymond, que interpreta Fábio, músico que tocou com o artista e que opera como narrador de sua história.


(Karen Lemos - Portal RedeTV!)

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Alceu Valença recorre ao cinema para dar poesia ao cangaço de Lampião


Em A Luneta do Tempo, projeto que durou 15 anos para ser concluído, artista pernambucano une cordel à narrativa cinematográfica

Quando o pai Décio de Souza Valença morreu, Alceu Valença lembrou das histórias que ele lhe contava quando pequeno; eram histórias sobre um passado marcado por fábulas e sangue e que, de tão encantadoras, fizeram o artista sentar-se na frente do computador para escrever um projeto que durou 15 anos para sair do papel. A demora, entretanto, valeu a pena.

Ainda sem saber muito bem o que fazer com o que tinha escrito, Alceu levou sua saga para as telonas após receber um incentivo de Walter Carvalho, renomeado fotógrafo de longas como "Carandiru" e "Madame Satã". “Isso aqui dá um filme”, bradou ao ler os rascunhos de Alceu.

Com uma visão profissional e cheia de poesia, o cantor e compositor pernambucano faz sua estreia no cinema com "A Luneta do Tempo", exibido durante a 38ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. O universo do longa-metragem diz tanto sobre Alceu quanto seu protagonista: Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião.

“Eu vivi nesse mato aí, sou lá do Sertão de Pernambuco”, já chegou dizendo Alceu, em conversa com a Revista O Grito!, que é de São Bento do Una, onde parte das filmagens foram realizadas. Sem poupar cangaceiros, vaqueiros, cavalo marinho, violeiros, poesia, cordel, circo e outros personagens da herança cultural nordestina, Alceu narra uma história de vingança que atinge três gerações diferentes. “O filme traz questões, metáforas, como a metáfora da vida e do tempo. A questão do tempo para mim – passado, presente e futuro – é tudo agora”, pontuou.

Com essa linha de pensamento, Alceu narra o confronto entre Severo Brilhante (Evair Bahia) – braço direito do bando de Lampião (Irandhir Santos) e Maria Bonita (Hermila Guedes) – e Antero Tenente (Aramis Trindade) pelas caatingas do Nordeste, bem como seus desdobramentos no futuro. Há, ainda, histórias paralelas, como a do poeta Severino Castilho que escreve um cordel a respeito de um encontro de Lampião e Maira Bonita no paraíso.

No elenco, além de nomes conhecidos do cinema nacional, como os já citados Irandhir e Hermila, Alceu também trouxe seus filhos, Ceceu, Juliano e Rafael, e amigos próximos, como os músicos Charles Teony e Ari de Arimatéia. “A escolha de atores foi muito natural, da forma como gosto. Veio quem estava perto de mim”, contou o diretor. Natural também foi o casamento entre música e cinema em "A Luneta do Tempo". Não estamos falando apenas da trilha sonora, escrita, claro, por Alceu. Os diálogos e boa parte dos sons, como tiros e passos, são todos ritmados como em uma sinfonia ou, melhor dizendo, como em um conto de cordel.

“Por ter tido essa ideia de fazer um musical, eu peguei todas as falas do roteiro e mostrei para os atores como fazer. Não fiz com a intenção de que eles me imitassem, mas queria que eles entendessem o tempo das falas, já que o filme foi todo feito em cima da música”, explicou Alceu, que tomou esse cuidado para que os atores soubessem usar pausas durante as rimas. “Não queria cansar o público”, pontuou.


Aos 68 anos, sendo 45 dedicados à música, Alceu tirou de letra a produção da trilha sonora (cerca de 80 músicas foram feitas para o filme). O mesmo não aconteceu com a direção, que necessitou de estudo, empenho e muita força de vontade para que a estreia fosse magistral.

“Dizem que o pessoal de cinema faz bullying com quem não é da área” declarou em tom bem humorado. “Então, fiz algumas aulas com Alessandra Alves, professora de cinema. Mas como eu não queria que meu filme fosse parecido com o de outras pessoas, fui estudar por mim mesmo; comecei a ver muitos filmes – alguns bons, outros ruins – e reparar na linguagem cinematográfica de cada um deles”, recordou o artista, que fez questão de participar de todo o processo para dar uma personalidade única ao seu projeto. “Nunca me curvei à indústria da música; com a indústria do cinema não seria diferente. Não faço nada por encomenda, respeito quem faz, mas eu não funciono dessa maneira. Queria fazer um filme meu. Pode ser ruim, pode ser o que for, mas é meu”.

Além de dirigir, Alceu também atua no longa-metragem na pele do palhaço Véio Quiabo; é uma atuação inspirada, revelando um talento do artista para a comédia. Não foi a primeira vez que Alceu mostrou seu lado ator. Em 1997 ele interpretou o próprio Lampião na novela "Mandacaru" ao lado de Daniela Mercury como Maria Bonita. Foi naquela época, inclusive, que Alceu guardou a roupa do cangaceiro como lembrança do trabalho que realizou na televisão. Mal sabia que ele que, anos depois, Lampião voltaria a cruzar seu caminho como nos versos do cordel de Severino Castilho: “Pela luneta do tempo, eu serei ressuscitado”, avisa o cangaceiro.

(Karen Lemos - Revista O Grito!)

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Exposição de Salvador Dalí mostra várias faces do artista catalão


Saindo do Rio de Janeiro, onde fez mais de um milhão de espectadores, a exposição Salvador Dalí – que reúne a maior retrospectiva do artista catalão que já passou pelo Brasil – chega a São Paulo no Instituto Tomie Ohtake.

Até o dia 11 de janeiro de 2015, o público poderá conferir obras provenientes de dois dos maiores colecionadores do pintor: Fundação Gala-Salvador Dalí e Museu Reina Sofia, ambos na Espanha. Diferente da temporada carioca, a exposição de São Paulo não terá obras do Museu Salvador Dalí, da Flórida; em contrapartida, outras raridades estarão disponíveis, como é o caso do valioso óleo sobre madeira “O espectro do sex-appeal” (1934), um dos grandes destaques da exposição na opinião de Carolina de Angelis, do núcleo de pesquisa e curadoria do Instituto.

“A obra é pequena, mas é de grande importância”, ressaltou em conversa com a Revista o Grito! durante a abertura do evento para convidados. “Quem conhece Dalí, reconhece suas características nessa obra: paisagem mineral, tons terrosos e uma figura meio monstruosa e meio humana que revela um medo da sexualidade, da libido, muito abordada por ele em sua arte”.

“O espectro do sex-appeal” está exposta entre outras 23 pinturas, 135 trabalhos entre desenhos e gravuras, 40 documentos, 15 fotografias e quatro filmes em um conjunto que demorou cinco anos para ser concebido. Dessa forma, o espectador terá contato com a produção de Dalí desde os anos 1920 até seus últimos trabalhos, o que torna possível a percepção de sua evolução técnica, suas influências e suas referências. 

Para Carolina, a amplitude alcançada pela curadoria mostra o quão versátil era a arte de Dalí. “A exposição não traz uma faceta específica dele”, explicou. “Não enfatizamos o Dalí pintor; o mostramos também como cineasta, como pesquisador – ele foi um grande pesquisador da ciência, da religião e da arte, estudando a holografia e buscas por terceiras dimensões na pintura – e também na literatura, cuja contribuição na área recebeu um grande enfoque nessa temporada”.

Dalí ilustrou de Dom Quixote a Alice 

De fato, há uma parte significativa da exposição dedicada à parceria entre Dalí e a literatura. Essa fatia do conjunto é uma grande atração para o público, já que a maioria conhece as histórias de Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carrol, Dom Quixote de la Mancha, de Miguel de Cervantes, O Velho e o Mar, de Ernest Hemingway, entre outros. Dalí fez gravuras para edições desses livros notórios, o que vai aumentar ainda mais o interesse do espectador.

“Além disso, há obras que abordam temas universais como a busca da pessoa amada, o existencialismo humano, dificuldades de se relacionar, e também temas despertam nossa curiosidade, como os sonhos e a psicanálise”, detalhou Carolina. Para ela, a figura excêntrica do artista também foi uma forma de parecer mais atrativo aos olhos de seu público. “A construção do personagem dele mostra muito isso. Ele estava preocupado em criar uma imagem que fosse muito divulgada e, dessa forma, aproximar as pessoas para que elas conhecessem suas obras”, explicou.

Contribuição no cinema 



A sétima arte também foi de interesse para o artista. É de grande estima, por exemplo, a parceria cinematográfica entre Dalí e o diretor surrealista Luís Buñel (1990 – 1983), que resultou nas obras O Cão Andaluz (1929) e A Idade do Ouro (1930), cujos excertos também estão expostos no Instituto.

Outra rica parceria se deu com o encontro do pintor com Alfred Hitchcock (1899 – 1980) em Quando Fala o Coração (1945), longa que apresenta cenas de sonhos desenhadas por Dalí. “Dalí era a melhor pessoa para realizar meus sonhos, é assim que os sonhos deveriam ser”, chegou a declarar Hitchcock ao comentar sobre o filme. Há ainda uma animação feita especialmente para a Disney, chamada Destino, que começou a ser pensada em 1945 e só terminou, proporcionalmente falando, em tempos recentes, no ano de 2003. O curta animado é uma verdadeira brincadeira entre aspectos provenientes do universo ímpar e singular do pintor.

Para finalizar, ainda é possível acessar uma obra interativa que, dado a sua complexidade, é necessário enfrentar um pouco de fila para dela usufruir. Trata-se de uma escultura de um enorme rosto em que se pode sentar-se na boca (que, na realidade, é um sofá) e tirar uma foto de dentro do rosto frente a um espelho – um recurso perfeito em tempos de selfies.

(Karen Lemos - Revista O Grito!)

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Festival celebra os 20 anos do Manguebeat no coração de São Paulo


Mundo Livre S/A

Há quem diga que nada fez – literalmente – tanto barulho nos últimos 20 anos na música brasileira do que o Manguebeat, movimento cultural surgido no Recife na década de 1990. Celebrar, então, as duas décadas do surgimento do gênero é uma responsabilidade e tanto que foi assumida pelo Festival Caranguejando, uma parceria do CCBB de São Paulo com a Baluarte Cultura.

Em um palco erguido em plena Praça do Patriarca, no coração do centro da capital paulista, oito artistas se reuniram para comemorar a data entre os dias 11 e 12 de outubro – um final de semana com direito a clima parecido com o do berço do Manguebeat, em que a máxima ficou entre os 30 graus.

No sábado, a banda paulistana Isca de Polícia abriu o evento convidando o carioca Serjão Loroza para o palco e, em seguida, um dos percussores do movimento, a Mundo Livre S/A, dividiu o espaço com Pedro Luís. Já no domingo foi a vez da banda Paraphernalia começar o dia com a brasiliense Ellen Oléria como convidada; na sequência, os recifenses do Mombojó fizeram sua homenagem na companhia do cantor Curumin.

Curadora do evento, Monica Ramalho explicou a diversificada seleção de artistas. “Queríamos uma banda seminal do Manguebeat, outra que demonstrasse que esse gênero continua vivo e ainda achamos interessante mostrar que o movimento também circula pelo país, pegando artistas do eixo Rio/São Paulo, sempre com convidados interessantes para fazer um tributo que não fosse óbvio”, ressaltou em conversa com a Revista O Grito!.

Primeiro dia: a autoestima de olhar o próprio umbigo 

Além de se apresentar no festival com a banda Isca de Polícia – que acompanhou a carreira de Itamar Assumpção (1949 – 2003) – Paulo Lepetit também assinou a direção musical do evento e, durante esse processo, ficou surpreso com as semelhanças de sonoridade e crítica social de Pernambuco com a vanguarda paulista. “Para o repertório, procurei músicas ‘irmãzinhas’, que se encaixavam pelo assunto ou pelo groove”, ressaltou Paulo, que recebeu Serjão Loroza, do Monobloco, no palco. “O Manguebeat mostrou autoestima ao olhar para o próprio umbigo e mostrar que o Brasil também é universal”, elogiou o cantor.

O show começou om um ‘mashup’ de “Não Há Saídas”, da Isca de Polícia, com “A Cidade”, da Nação Zumbi, provando que o discurso entre as duas bandas ultrapassa fronteiras. Músicas pré-Manguebeat, como “Papagaio do Futuro”, de Alceu Valença, e “Vendedor de Caranguejo”, de Gordurinha (1922 – 1969), também tiveram vez no roteiro.

Foi justamente com a canção “Manguebit”, que abre o primeiro disco "Samba Esquema Noise", que Fred 04 e a Mundo Livre S/A deram início ao tributo a uma história em que eles próprios ajudaram a escrever. “Passa um filme na minha cabeça”, definiu Fred, em conversa com O Grito!. “Eu cresci em uma geração que tinha várias ideias bacanas, mas que precisava se mandar, porque o Recife e o Nordeste viviam uma situação econômica e cultural de estagnação”, recordou. “Hoje, vivemos uma situação oposta; as novas bandas de Recife têm uma responsabilidade grande, porque o grau de interesse agora é maior”.


Mombojó

Após apresentarem outros trabalhos do grupo, como “Pastilhas Coloridas”, “O Mistério do Samba” e “Meu Esquema”, a Mundo Livre S/A ainda convidou Pedro Luís e presenteou o músico com uma nova roupagem para seu sucesso “Caio no Swing”. “Gostei muito da versão batizada de Manguebeat para essa música. Só vou tocar essa daqui pra frente”, brincou Pedro. “Esse gênero é de uma linguagem que tem muita personalidade. Fico honrado de ter sido chamado para fazer parte de um evento que celebra algo tão importante para a música”, concluiu o músico, que ainda teve o privilégio de dividir os vocais com Fred na música “Samba Makossa”, de Chico Science (1966 – 1997).

Segundo dia: mangue de formação 

Por ser tratar de uma banda instrumental, os músicos da Paraphernalia se preocuparam, principalmente, em pincelar canções do gênero que fossem melhor executadas na formação instrumental. “O forte do Manguebeat é o ritmo, a levada; e foi dessa forma que mostramos nossa versão e como enxergamos o movimento”, declarou Donatinho, tecladista do conjunto. Nada melhor do que abrir a apresentação com “Quilombo Groove”, uma das faixas do segundo disco de trabalho da Nação Zumbi e que explora muito bem o instrumental.

Com Ellen Oléria, o Paraphernalia trouxe voz para músicas representativas do Manguebeat, como “Mormaço” e “Blunt of Judah”, da Nação Zumbi, e “Cuba” e “Bob”, de Otto. “Sou muito influenciada pelo movimento. Em meu último disco gravei ‘Anunciação’, do Alceu Valença, já estava bebendo nessa fonte”, pontuou Ellen.

O último show do evento contou com uma banda representativa do gênero e um artista contemporâneo que recebeu influências da época em que o Manguebeat começava a ganhar seu espaço no mercado fonográfico. “Tenho 38 anos, portanto eu cresci sob essa atmosfera [de expansão do movimento]. Lembro que eu saia para curtir e o som do Manguebeat era sempre muito presente; fez parte da minha formação cultural”, explicou Curumin em entrevista a reportagem.

No palco, o paulistano e os músicos do Mombojó abriram o leque para vários artistas do movimento. Teve um pouco de tudo: “Computadores Fazem Arte”, da Nação Zumbi, “Dias de Janeiro” e “Ciranda de Maluco”, de Otto, “Coqueiros”, da banda Eddie, e “Punk Rock Hardcore”, do Devotos, além de “Casa Caiada”, “Pro Sol” e “Deixe-se Acreditar” do próprio Mombojó. “É uma honra poder tocar todas essas músicas sendo um nome que também representa esse movimento”, afirmou Marcelo Machado, guitarrista da banda. “Foi um show de fãs para seus representantes”, concluiu.

(Karen Lemos - Revista O Grito!)

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Uma conversa com Walter Carvalho: “minha obra principal é a próxima”


Foto: Carol Andrewsk

Com a fotografia assinada em mais de 70 produções, Walter Carvalho recebe uma merecida mostra com os principais filmes de sua carreira reunidas em A Luz (Imagem) de Walter Carvalho, em cartaz no Caixa Belas Artes de São Paulo até 15 de outubro.

Em um bate papo aberto ao público que contou também com a presença do cineasta Beto Brant (com quem trabalhou em "Crime Indelicado") e da jornalista Maria do Rosário Caetano, Walter falou da honra de ser homenageado e de poder fazer um balanço de sua trajetória em seus 35 anos – completos em 2014 – como fotógrafo de cinema. “Vendo novamente todos esses filmes reunidos, me lembrei de uma metáfora oriental. O camponês japonês sempre planta seu arroz de costas para o terreno vazio e de frente para a plantação, pois a preocupação não é com o que falta plantar, mas se o que está sendo feito está correto. Essa mostra fez com que o virasse para trás e pensasse isso”, resumiu Walter durante a conversa com o público.

“É algo curioso demais. Descobri que meu trabalho em alguns filmes significava uma coisa antes e agora significa outra. Alguns filmes eu até não entendia e, agora, consigo entender. Tem sido estimulante”.

Entre longas e curtas-metragens e alguns projetos para a televisão, a mostra acabou por traçar um panorama do cinema brasileiro dos últimos 40 anos por reunir obras conhecidas desse período da produção nacional como "Central do Brasil", "Carandiru", "Madame Satã", "Cazuza, O Tempo Não Para", "Lavoura Arcaica", "Amarelo Manga", "Janela da Alma", além de contemplar filmes dos mais diversos diretores como Walter Salles, Sandra Werneck, Ruy Guerra, Cláudio Assis, Julio Bressane, Karim Ainouz, entre muitos outros.

“Costumo dizer que minha obra principal é a próxima. Sou um mutante. Tendo dirigido a fotografia de filmes de diretores de várias origens, mais velhos ou mais novos do que eu, tive a possibilidade de trabalhar com a descoberta do criativo. Cinema você faz para ver como fica e você só descobre o que é quando acaba”, ressaltou.

O Nordeste nunca te deixa

Nascido em João Pessoa, na Paraíba, Walter se envolveu com o Cinema Novo e teve seu destaque a partir da Retomada. Embora atualmente more no Rio de Janeiro, sempre faz visitas a terra natal. “Existe um sistema de visão onde o objeto mais distante é o que te acompanha mais. Repare quando você está na estrada: a montanha lá no horizonte nunca te deixa, mas o poste ao lado passa tão rápido que você mal consegue vê-lo. Isso é o que acontece com o Nordeste dentro de mim – está longe, mas nunca me deixa”, declarou.

Em um desses retornos às suas origens, Walter teve a alegria de assinar a fotografia de uma das grandes obras do cinema da retomada: "Central do Brasil", do xará Walter Salles. “Uma das maiores felicidades para mim foi ter sido chamado para fazer esse filme. Na história, o personagem busca seu pai no sertão nordestino e, assim como ele, eu também estava em busca de alguma coisa, algo que eu introduzi no filme do Walter [Salles] ao voltar àquele lugar”, recordou. “Depois que ‘Central’ foi lançado, alguém me perguntou que filtro eu usei na fotografia do filme. Que filtro eu usei? Eu usei meu pai, o nordeste, a cor, a terra, o céu, enfim, não tem importância. Filtro é apenas um acessório, a fotografia do filme é muito maior do que a gente pode imaginar”.

Outra parceria no cinema também proporcionou um feliz reencontro de Walter com suas raízes. Durante o Festival de Brasília no ano em que "Baile Perfurmado", de Paulo Caldas e Lírio Ferreira, foi exibido, Walter conheceu o irreverente Cláudio Assis no banheiro. Lá, os dois trocaram figurinhas e fecharam trabalhar juntos em um piloto para a televisão sobre o rio São Francisco (o projeto em questão era "Opara", de 1999). Ao viajarem para Recife para filmar, Cláudio mostrou a Walter sua ideia para o curta-metragem "Texas Hotel". A partir daí, surgiu uma bem sucedida parceria entre os dois que resultou nas obras "Amarelo Manga", "Baixio das Bestas" e "Febre do Rato". “Agora a gente deu uma parada, é que nem casamento sabe”, riu Walter ao ser questionado a respeito de sua ausência na direção de fotografia de "Big Jato", novo longa de Cláudio.

Estudos sobre a sujeira

Foi com Cláudio Assis que Walter provou não ter medo de ousar. A fotografia escura dos filmes do diretor pernambucano são tão únicas quanto a fotografia suja de "Cazuza, O Tempo Não Para", de Sandra Werneck. A ‘sujeira’, aliás, ele conta, foi totalmente proposital. “A ideia surgiu quando li alguns livros sobre Cazuza escritos por sua mãe, Lucinha Araújo. Descobri que Cazuza gostava de fotografia e gostava de ser fotografado, então sugeri fazermos uma fotografia como se fosse o próprio fotografando: de uma forma ‘errada’, amadora, mas, justamente por isso, com muito amor”, contou Walter que, neste longa, deu oportunidade para seu filho, Lula Carvalho, seguir seus passos. Hoje, Lula é também um renomado fotógrafo de cinema cujo último trabalho foi em "As Tartarugas Ninjas", de Michael Bay. “Na época do ‘Cazuza’ eu dizia no ouvido dele: ‘Você não está empunhando uma câmera, mas uma guitarra desafinada”, recordou, aos risos. Mesmo com uma fotografia fora dos padrões, “Cazuza” fez mais de três milhões de espectadores, provando que os ‘riscos’ assumidos por Walter desde o início valeram a pena.

Há muitos exemplos como esses na filmografia de Walter. E sempre haverá, já que estamos falando de um fotógrafo incansável no auge de seus 67 anos. Este ano, ele concluiu "O Rebu", minissérie para a televisão cuja fotografia foi muito elogiada pela crítica, está lançando seu documentário "Brincantes", sobre o músico pernambucano Antonio Nóbrega, enquanto prepara outro filme batizado de "Um filme de Cinema” e deve ainda lançar um livro intitulado "Contrastes Simultâneos". Mesmo depois de muito trabalho, ele continua na ativa – e não dá sinais de que irá parar.

“Sempre digo que fotografia não se aprende, fotografia se pratica. Se eu descobri que aprendi e sei fotografar, minha vida ficará sem sentido, porque eu sei, oras! Qual é a graça?”, brincou ao abrir a mostra em sua homenagem.

(Karen Lemos - Revista O Grito!)

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Exposição de fotos inéditas traz a figura humana por trás da artista Frida Khalo


Encontradas em um banheiro da Casa Azul (residência na qual morou no bairro de Cocoyacán, na Cidade do México) e guardadas com muito zelo e apreço, as fotografias de Frida Kahlo são tão reveladoras quanto as pinturas que a imortalizaram como um dos grandes nomes da arte hispânica.

Reunidas na exposição Frida Kahlo – as suas fotografias que está rodando o mundo, os registros fotográficos chegam pela primeira vez no Brasil no Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, e mostram uma faceta curiosa e até inédita, mesmo se tratando de uma mulher que nunca temeu se expor.

“São retratos intimistas que possibilitam que o público vivencie as emoções de Frida nas fotos, isso trouxe algo a mais para esta exposição”, explica Estela Sandrini, diretora cultural do museu que está celebrando o grande sucesso da mostra: mais de 90 mil pessoas já conferiram a exposição (em uma média de 30 mil pessoas por mês); por conta disso, a exibição foi prorrogada e poderá ser visitada até o dia 30 de novembro.

“O curioso é que essa coleção foi exposta sem saber ao certo como o público iria vê-la. Poderia até passar despercebida, mas acreditamos na proposta, apostamos em seu sucesso e deu certo”, ressaltou Sandrini, que apontou a história de vida de Frida – que sofreu um grave acidente aos 18 anos, sua postura diante de tanto sofrimento e da superação ao fazer da dor uma arte como razões para o êxito da mostra.

São 241 imagens divididas em seis seções que tratam de aspectos importantes da trajetória da artista, principalmente porque Frida teve contato com a fotografia quase que a vida toda: ela foi retratada desde a infância por seu pai e pelo avô materno (que eram fotógrafos), por amigos profissionais como a alemã Gisèle Freund e o húngaro Nickolas Muray e também por sua paixão pelo autorretrato – bastante abordada em seus quadros – uma ‘mania’ que herdou do próprio pai. Como nunca foram exibidas antes, muitas dessas fotografias são inéditas – o que garante algumas gratas surpresas. “Existe um registro de Diego Rivera (famoso pintor mexicano e grande amor da vida de Frida) que ela guardou com a marca de um beijo. Os dois tiveram um casamento aberto bastante conturbado e, mesmo assim, Frida sempre teve uma paixão por ele, uma paixão que nunca morreu”, destacou Estela Sandrini.


Saiba mais sobre as seções da mostra:

Origens – Os Pais 
A seção destaca a família de Frida; são registros antigos – porém bem preservados – que mostram os avós maternos da pintora e seus pais Matilde Calderón e Guillermo Kahlo.

Casa Azul 
Aparecem aqui os primeiros registros fotográficos de Frida que, ainda pequena, posava para as lentes de seu pai. Há também retratos de reuniões familiares e entre amigos que aconteciam na Casa Azul – onde hoje funciona o Museu Frida Kahlo.

Corpo Acidentado
A mais dolorida e, sobretudo, mais surpreendente seção da mostra. Traz imagens da época do acidente que sofreu em 1925 quando o ônibus em que viajava se chocou com um bonde. Na tragédia, Frida sofreu diversas fraturas, passou por muitas intervenções cirúrgicas (35 no total) e precisou permanecer imóvel durante muito tempo em sua cama. No leito da dor, a artista posou para Nickolas Muray durante seu período de recuperação.

Amores 
Espaço dedicado às paixões de Frida como amigos íntimos, familiares e amantes. Há registros curiosos, como uma fotografia em que a artista aparece aos beijos com um rapaz fardado cuja identidade não é divulgada. Diego Rivera, claro, surge em várias imagens ao lado de declarações de sua companheira. “Na minha vida tive dois acidentes, num deles um bonde me atropelou… O outro acidente é Diego”, pontuou Frida em uma de suas citações.

Fotografia 
Trata-se de um numeroso arquivo reunido em vida que se estende a raridades como cartões de visita do século XIX, imagens assinadas por grandes nomes da fotografia, como Man Ray, e retratos atribuídos a Frida que revelam seu talento também na arte fotográfica.

Luta Política 
A sexta e última seção da exposição aborda o lado político de Frida, que era comunista. As imagens, na verdade, são recordações de Diego que colecionava registros sobre o tema, como o cotidiano de Berlim e Rússia no período de existência da União Soviética e retratos de líderes e pensadores marxistas como Lenin, Stalin e Trotsky (este último, vale lembrar, teve um rápido envolvimento com Frida na ocasião em que morou na Casa Azul).

Além de expor a artista e a figura por trás da artista, “Frida Kahlo – as suas fotografias” salienta a importância de uma contribuição cultural sem preço, que flertou com surrealismo e a vanguarda, sugando elementos folclóricos dos astecas e de indígenas mexicanos, e que agora está eternizada não somente em quadros, mas também na fotografia – ferramenta mais efetiva contra o esquecimento. “A exposição é uma oportunidade para conhecer Frida da forma como ela mesma se via – ela se mostrou por inteira nessa exposição”, concluiu Sandrini.

(Karen Lemos - Revista O Grito!)

sábado, 20 de setembro de 2014

Trailer mostra Tim Burton menos fantasioso em "Big Eyes"


O trailer de "Big Eyes", novo longa-metragem assinado por Tim Burton, foi divulgado e surpreendeu os fãs ao mostrar o cineasta afastado do universo da fantasia que o consagrou.

Mais 'realista', Burton apresenta a história de Margaret Keane (Amy Adams), uma pintora que ficou famosa por desenhar crianças com grandes olhos durante as décadas de 1950 e 1960. Em um período em que as mulheres tinham dificuldades em se destacar, seu marido Walter (Christoph Waltz) se aproveita da situação e se diz autor das obras, levando todo o crédito do talento artístico de sua companheira.

Confira o trailer:




Notório por seus filmes surreais e, por vezes, sombrios como "Edward Mãos de Tesoura", "O Estranho Mundo de Jack", "Os Fantasmas se Divertem", entre outros, o diretor também abriu mão de atores-chaves com os quais costuma a trabalhar, caso de Johnny Depp e Helena Bonham Carter (também sua esposa). Ao invés da dupla, Tim optou por trabalhar com a delicadeza de Amy Adams, estrela de "Trapaça", e a 'vilanice' de Waltz, que caiu no gosto do público ao interpretar personagens surpreendentes em "Bastardos Inglórios" e "Django Livre", ambos de Quentin Tarantino.

"Big Eyes" tem previsão de estreia para dezembro deste ano nos EUA.

(Karen Lemos - Portal RedeTV!)

"Hoje Eu Quero Voltar Sozinho" disputa vaga entre concorrentes ao Oscar



O filme "Hoje Eu Quero Voltar Sozinho", de Daniel Ribeiro, foi o escolhido para representar o Brasil na corrida do Oscar em 2015. O longa vai concorrer por uma vaga entre os selecionados para disputar a estatueta de melhor filme estrangeiro.

A escolha foi anunciada nesta quinta-feira (18) na Cinemateca Brasileira, em São Paulo, com a decisão de uma comissão nomeada pelo Ministério da Cultura.

Os finalistas serão anunciados em janeiro e o grande vencedor será conhecido no dia 22 de fevereiro de 2015, data da próxima premiação a ser realizada em Los Angeles, nos Estados Unidos.

"Hoje Eu Quero Voltar Sozinho" recebeu o prêmio da crítica internacional no Festival de Berlim deste ano. A história gira em torno de um garoto deficiente visual que se descobre homossexual durante sua adolescência.

Caso seja eleito como um dos concorrentes para o prêmio de melhor filme estrangeiro, o longa-metragem de Daniel Ribeiro quebrará um hiato de 15 anos de ausência do Brasil no Oscar. A última vez em que o cinema nacional teve destaque foi em 1999 com "Central do Brasil", de Walter Salles. Na ocasião, Fernanda Montenegro também disputou a estatueta como melhor atriz, mas perdeu para Gwyneth Paltrow por seu trabalho em "Shakespeare Apaixonado" - episódio que entrou para o hall de injustiças cometidas pela premiação.



(Karen Lemos - Portal RedeTV!)

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Cobertura: Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo


"Se Essa Lua Fosse Minha"

Celebrando 25 anos de existência, o Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo apresentou uma programação plural, com destaque para seis novas produções do cinema pernambucano, exibidas entre outros 331 filmes de 51 países em alguns cinemas da capital paulista entre os dias 20 a 31 de agosto.

O gaúcho "Se Essa Lua Fosse Minha", de Larissa Lewandoski, sobre moradores de rua de Porto Alegre, levou o Prêmio Itamaraty – principal do evento. Três produções de Pernambuco se destacaram entre os premiados. Exibido na Quinzena dos Realizadores do último Festival de Cannes, "Sem Coração", de Nara Normande e Tião, levou o prêmio CTAv e ficou entre os favoritos do público. "Casa Forte", estreia de Rodrigo Almeida, recebeu o troféu Cachaça Cinema Clube.

Costurado por imagens de fachadas de prédios do Recife que exibem nomes em referência ao período colonial, o curta "Casa Forte" narra uma história sob dois pontos de vista diferentes. “Eu não queria que o filme fosse mais um – chamando bem grosseiramente – ‘filme de prédio’ do recente cinema pernambucano, daí resolvi desenvolver dois depoimentos, a partir de uma outra ideia que eu tinha e que tornasse a colocação do filme mais contundente”, explicou Rodrigo em conversa com a Revista O Grito!. “Escrevi dois textos narrados, criando um ruído envolvendo o suposto fetiche de um homem branco por negros e o uso do negro para estabelecer uma relação de dominação inversa”.

Destaques de Pernambuco 

Muito aguardado por conta de seu conteúdo que, após os últimos acontecimentos, ganhou outra significância, "Em Trânsito", de Marcelo Pedroso, teve uma recepção curiosa. O curta-metragem que trabalha com a exploração da imagem de Eduardo Campos, presidenciável morto em um acidente aéreo, teve sua primeira exibição no festival após a tragédia. Mesmo uma cena em que um cartaz ilustrativo do político é decapitado, não causou espanto e o público riu e aplaudiu a obra cuja crítica social permanece fresca. “Neste momento em que várias coisas podem se confundir, é importante frisar a intenção política do filme: uma crítica ao projeto desenvolvimentista, ao personalismo, a uma forma antiga de fazer política que se dizia nova. É nesses termos que se funda o gesto da obra e é assim que espero que ela possa continuar a ser vista e debatida, não obstante o impacto desestabilizador da tragédia e da morte”, declarou Marcelo em um comunicado lido pelo assistente de direção Carlos Nigro antes da sessão.


"A História Natural"

Premiado no último Festival de Cinema de Gramado, "A História Natural", de Júlio Cavani, deixou o público intrigado com um misterioso objeto orgânico que é colhido de uma árvore que, de tão alta, acaba isolada em sua existência. “Perto da minha casa, no bairro Dois Irmãos, tem uma floresta na qual, em cima de um morro, existe uma árvore mais alta que todas as outras. Queria fazer algum trabalho artístico com isso e saí pelo mundo buscando árvores nessa mesma situação de isolamento”, explicou o diretor. Sobre o estranho objeto, ele definiu: “Ninguém sabe o que é. Alguns acham que é um fruto, outros uma casa de inseto ou uma armadilha, ouvi até dizer que é um ovo alienígena. Vai da interpretação de cada um”, completou Júlio, que usou referências de filmes de ficção pós-apocalípticos e histórias em quadrinhos neste trabalho.

Sob um clima de terror existencialista, "Loja de Répteis", de Pedro Severien, traz uma atmosfera decadente de um inusitado comércio e de como isso afeta o dia a dia de um casal, cada vez mais consumido pelo ambiente inóspito em que vive. “Ao usar uma loja que comercializa animais, eu desejava questionar também essa lógica consumista na qual vale tudo para obter o sucesso financeiro”, explicou Severien. O curta conta com a ‘atuação’ de um jacaré, encontrado por ele em uma empresa de abate em Alagoas. O animal é o principal causador de toda a estranheza abordada na obra. “Desde a primeira sessão, percebi que o filme parece atingir o público com um misto de estranhamento e prazer”, pontuou.

Foi um encontro com uma curiosa fotografia que levou Mariana Lacerda a filmar "Pausas Silenciosas". O filme mostra os registros de um Recife – não mais existente – sob as lentes do fotógrafo Alcir Lacerda (não há parentescos com a realizadora) e captura sua lenta perda de memória por conta do Alzheimer. “Alcir fotografou o Recife para que nós não nos esquecêssemos da cidade que um dia tivemos. Ele salvou do curso do tempo a nossa cidade”, declarou Mariana, que traz um trabalho contundente em tempos de críticas diante de um desenfreado crescimento urbano. “Foi muito bom ter o exercício de olhar essas fotografias que estavam adormecidas, escondidas em um arquivo, e colocá-las em uma dimensão cinematográfica”, concluiu.

Brasil dentro e além das fronteiras 

As mostras nacionais trouxeram outras gratas surpresas, como produções brasileiras filmadas em outros países, traçando um panorama internacional sob novos pontos de vista. Um bom exemplo disso é a coprodução Brasil/Egito "Bashar", de Diogo Faggiano, que testemunha os conflitos na Síria e de como a guerra civil tem trazido extremo sofrimento à sua população indefesa. Filmado em Aleppo, em novembro de 2012, a produção do curta envolveu alguns riscos. “Tínhamos medo de ter as imagens apreendidas, fosse na Síria ou no Egito. Por isso guardávamos backups nas meias e debaixo do colchão”, recordou Diogo, em conversa com O Grito!. Para o cineasta, o mais difícil do todo o processo é encarar os ‘fantasmas’ da guerra presentes no seu trabalho. “É estranho saber que a maioria dos homens que aparecem no filme estão mortos. E, de certa forma, o que sobrou desses homens está contido num cartão de memória”. Além do curta, o material que a equipe conseguiu em terras sírias (e outros locais do Oriento Médio) será transformado no longa-metragem A Revolução do Ano, com estreia prevista ainda para este ano.


"Efeito Casimiro"

Bem distante das nossas fronteiras, "Efeito Casimiro", de Clarice Saliby, ‘pega carona’ até Júpiter, de onde alienígenas se comunicam com um ser humano e, através dele, anunciam uma visita a Terra, usando a pacata cidade de Casimiro de Abreu, no Rio de Janeiro, como local de pouso. Embora pareça absurdo, o anúncio mobilizou centenas de pessoas no Brasil (e de alguns outros países) na década de 1980. “Meu pai estava nesse evento e ele me contava essa história desde que era pequena. Quando comecei a fazer cinema, pensei que isso daria um ótimo documentário”, contou Clarice à reportagem. A história agradou e recebeu um prêmio do festival, além de ter ficado entre os favoritos do publico. “Acredito que histórias sobre discos voadores mexem com o imaginário de qualquer ser humano, não importa sua idade ou classe social. É um filme pop, sem restrições. Por isso tem tido uma recepção bem calorosa, mesmo para quem não acredita nesse tipo de coisa”, acrescentou.

Filmado no Vietnã, "O Caminhão do meu Pai", de Maurício Osaki, traz em seu enfoque a relação de pai e filha e do choque de realidade que a criança enfrenta em suas primeiras excursões pelo mundo. “Quando visitei o Vietnã pela primeira vez, enquanto eu dirigia pelo interior ou me perdia pelas multidões da cidade, via a mesma vivacidade e energia que havia visto pelo interior do Brasil”, contou Maurício, ao ser questionado sobre a decisão de filmar no Vietnã. Com atores locais no elenco, que não falavam inglês, ele precisou de um tradutor para se comunicar. Valeu a pena. “Eu sabia que isso poderia aumentar as dificuldades de filmagem, mas por outro lado, os atores tinham um entendimento, uma naturalidade e entrega que me agradava muito”.

Boas histórias também vieram dos mais diversos lugares do Brasil; no caso de "Contos da Maré", de Douglas Soares, muitas delas. “O curta traz histórias que meus familiares maternos me relatavam, todos residentes do Complexo da Maré, e que sempre povoaram minhas lembranças. Nos últimos anos, comecei a perceber que uma geração mais nova de primos e moradores da favela desconheciam tais lendas. Usar o cinema como resgate e divulgação desse passado me pareceu um bom caminho”, explicou o diretor que traz em sua obra contos que envolvem lobisomens, sopa de cobra que misteriosamente mata quem a come, e até um morador que transou com uma porca, dando origem a um ‘bebê porco’.


"Edifício Tatuapé Mahal"

Criativo, "Edifício Tatuapé Mahal", de Carolina Markowicz e Fernanda Salloum, mostra os bastidores da ‘realidade’ dos bonecos de maquete. A ideia surgiu quando uma das diretoras se deparou com alguns modelos de bonecos que a impressionou pela perfeição nos detalhes. “Usamos referências que visavam transformar os bonecos em pessoas, mas com a vantagem da licença poética que a animação oferece”, afirmou Carolina em conversa com a reportagem. A dupla utilizou a técnica stop motion e 3D para dar vida aos bonecos. Vale destaque, também, o trabalho do ator uruguaio Daniel Hendler na narração do curta. “Foi maravilhoso trabalhar com Daniel. Ele captou o espírito do personagem com uma rapidez impressionante e acrescentou em vários aspectos”, elogiou a realizadora.

Internacionais e programas especiais 

A programação internacional teve destaques como "A Outra Mulher", de Marie Ka, do Senegal, que conta a história de um casal de lésbicas tentando sobreviver em um país onde amar uma pessoa do mesmo sexo impõe multas e até prisão. O alemão "Três Pedras para Jean Genet", de Frieder Schlaich, atraiu fãs da música ao trazer Patti Smith em uma jornada até o túmulo do escritor francês que batiza o curta. Ainda na música, "Nevermind", de Jean Marc E. Roy, recordou Kurt Cobain, vocalista do Nirvana morto em 1994.

O festival também preparou alguns programas especiais para esta edição, caso de "Quebrando Muros" que, em parceria com a distribuidora Interfilm Berlin e apoio do Instituto Goethe, trouxe raridades às telonas para celebrar os 25 anos da queda do Muro de Berlim, como produções oficiais da Stasi – a polícia secreta da Alemanha Oriental, entre elas "Guerra em Tempos de Paz: Assim Seguimos!" e "Cabeça Fria, Coração Quente, Mãos Limpas". Já o programa “Diversidade Sexual – Assunto de Família” apresentou quatro filmes internacionais que trataram de assuntos ligados à identidade, aceitação e tolerância, caso do romeno "Honra", sobre um general aposentado e seu desafio de aceitar a homossexualidade do menino que criou.

(Karen Lemos - Revista O Grito!)

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Jorge Furtado lança novo filme "O Mercado de Noticias" e diz que jornalismo vive uma era de ouro


O mesmo olhar crítico das ficções "O Homem que Copiava", "Meu Tio Matou um Cara" e "Saneamento Básico, O Filme" está em "O Mercado de Notícias", novo longa-metragem de Jorge Furtado, eleito melhor documentário pelo júri oficial e popular do 18º Cine PE.

O filme chegou aos cinemas de dez cidades: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba, Salvador, João Pessoa, Santos e Juiz de Fora (as datas das demais cidades ainda não foram anunciadas).

Desta vez, o tema é a explosão digital e sua influência no jornalismo que está em plena e ainda pouco compreendida mudança. Apaixonado por notícias (“não vivo sem elas”, confessou), Furtado decidiu mergulhar nessa discussão até por uma questão pessoal. “Eu tinha uma dívida a sanar, já que larguei o curso de jornalismo para fazer cinema”, explicou durante a pré-estreia de seu novo trabalho em São Paulo. 

Decidido a investigar causas e consequências desse novo jornalismo na era dos blogs e das redes sociais, o cineasta voltou ao passado para entender o nascimento da imprensa e acabou descobrindo uma pérola: a peça The Staple of News, de Ben Jonson, datada de 1625. “Nunca tinha ouvido falar dessa peça e descobri que era pouco conhecida mesmo, tanto que eu precisei traduzi-la para o português”, recordou. 

Mas, o que teria a ver um texto do século 17 com os dias de hoje? Tudo, segundo Furtado. “Usei a peça como um guia, pois me pareceu extremamente atual”. E de fato é! A briga pelos interesses por trás de uma reportagem, a apelação para fazer do fato o mais atraente possível aos olhos do leitor e o dinheiro que passeia nos bastidores da notícia são explorados sem acanhas em um texto escrito há quase 400 anos.

Jorge Furtado

Além da peça, "O Mercado de Notícias" trabalha com mais duas linhas que, juntas, formam o tripé do documentário: entrevistas com jornalistas conceituados (como Cristiana Lôbo, Luis Nassif, Mino Carta e muitos outros), cenas da peça filmadas especialmente para o longa-metragem e pequenas ‘reportagens’ que é o próprio Furtado quem investiga para alimentar sua alma de jornalista.

Duas dessas reportagens merecem menção. Uma delas é o caso da bolinha de papel que atingiu o político José Serra durante sua campanha eleitoral. Furtado usa vários pontos de vista para debater as muitas interpretações feitas pelos veículos de comunicação na ocasião do ocorrido.

Outro destaque é o Picasso do INSS – um quadro assinado por Pablo Picasso que repousa em uma das salas do Ministério da Previdência Social em Brasília. O fato ganhou até capa de jornal quando noticiado. Como já havia estudado artes plásticas, Jorge Furtado percebeu que o quadro se tratava, na verdade, de uma reprodução da obra original, atualmente exposta em um famoso museu de arte na Alemanha.

Apesar do cenário beirando ao catastrofismo, o cineasta diz manter uma visão otimista para o futuro. “Ao menos mais otimistas do que os meus entrevistados no filme”, explicou. “Na minha opinião, o jornalismo está vivendo sua era de ouro; depois dessa confusão que a internet proporcionou, vamos saber o que realmente está por vir”.

Em uma de suas frases no documentário, o jornalista Fernando Rodrigues declara ser difícil entender uma revolução quando ela está acontecendo. E é com esse fio de esperança que Jorge Furtado faz sua defesa. “Existe uma tendência de menosprezar a tecnologia, mas ela não só transforma como também se soma a outros meios”, pontuou. “Disseram que o vinil estava acabado, mas estou até hoje comprando discos”.

(Karen Lemos - Revista O Grito!)

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Noite de prêmios da sexta edição do Festival de Cinema de Paulínia

Camilo Cavalcante, diretor de "A História da Eternidade", é premiado em Paulínia

A História da Eternidade”, de Camilo Cavalcante, foi o grande vencedor da sexta edição do Festival de Cinema de Paulínia. A premiação aconteceu na noite deste domingo (27) no teatro municipal da cidade.

“Esse filme fala de amor, foi feito com amor e encontrou muito amor aqui em Paulínia”, declarou o diretor pernambucano ao subir ao palco para receber o troféu de melhor filme e melhor direção.

Os prêmios de ator e atriz também ficaram para o longa-metragem. Irandhir Santos, que vive Joãozinho na ficção, foi agraciado por sua atuação. Em uma decisão inédita, as três atrizes principais do filme foram premiadas: Zezita Matos, Marcélia Cartaxo e Débora Ingrid dividiram a honra. “É uma emoção muito grande receber este prêmio em nome de minhas companheiras”, disse Zezita.

Marcello Novaes, um dos astros de “Casa Grande”, foi considerado o melhor ator coadjuvante dos filmes que passaram pelo festival. Por conta de compromissos profissionais, ele não pode estar presente no evento. Clarissa Pinheiro, também de “Casa Grande”, levou o troféu de atriz coadjuvante na pele de uma surpreendente empregada doméstica.

O grande homenageado da noite foi Cacá Diegues por seu conjunto de obra e sua significativa contribuição para o cinema brasileiro. “Quando você começa a receber homenagens, é um sinal de que você está velho”, brincou o cineasta, arrancando risos da plateia. “Mas vou decepcioná-los, porque não vou pedir minha aposentadoria ainda. Meu grande amor pelo cinema me faz continuar a fazer filmes", pontuou.

Confira todos os vencedores: 

Longa-metragem: 
Melhor filme: “A História da Eternidade”
Melhor direção: Camilo Cavalcante, de “A História da Eternidade”
Melhor atriz: Zezita Matos, Marcélia Cartaxo e Débora Ingrid, de “A História da Eternidade”
Melhor ator coadjuvante: Marcello Novaes, de “Casa Grande”
Melhor atriz coadjuvante: Clarissa Pinheiro, de “Casa Grande”
Melhor figurino: “Sangue Azul”
Melhor trilha sonora: “Sinfonia da Necrópole”
Melhor direção de arte: “Boa Sorte”
Melhor som: “Castanha”
Melhor montagem: “Aprendi a Jogar com Você”
Melhor fotografia: “Sangue Azul”
Melhor roteiro: “Casa Grande” 

Curta-metragem:
Melhor filme: “O Clube”
Melhor direção: “O Clube”
Melhor roteiro: “Edifício Tatuapé Mahal”
Prêmio especial do júri: “Bom Comportamento”

Escolha do público: 
Longa-metragem: “Boa Sorte”
Curta-metragem: “O Clube”

Prêmios da crítica: 
Longa-metragem: “A História da Eternidade”
Curta-metragem: “O Clube”

(Karen Lemos - Portal RedeTV!)

"A História da Eternidade" surpreende com Sertão real, duro, mas também belo


Longe dos avanços tecnológicos e do crescimento vertical visto nas grandes cidades do país está Santa Fé, um pequeno vilarejo a 60 quilômetros de Petrolina. Lá, Joãozinho tenta fazer sua arte, sempre vigiado de perto por moradores tradicionalistas da vila. Enquanto isso, Alfonsina sonha em ver o mar e Das Dores ainda se castiga por um desejo sexual reprimido.

Três histórias paralelas que ocorrem no mesmo lugar dão conta de abrir o leque da representação do Sertão nordestino – nem sempre apresentado com devida franqueza pelo cinema brasileiro – no longa-metragem "A História da Eternidade", exibido na noite de sábado (26) no Festival de Cinema de Paulínia.

Criador do projeto “Cinema Volante Luar do Sertão”, que leva o audiovisual para o Sertão, o diretor Camilo Cavalcante não poderia ter encontrado lugar mais adequado para abordar questões que presenciou enquanto viajava por muitos vilarejos castigados pela seca.

“O filme ajuda a perceber o quanto deste milagre econômico no Brasil é, na verdade, uma farsa. Estamos vivendo um desenvolvimento mentiroso”, afirmou o cineasta em entrevista coletiva no evento. “Prédio alto em Recife não é desenvolvimento. Existe uma confusão de que desenvolvimento é obra e nunca pensam no resultado disso”.

A falta de avanço, no entanto, traz relações mais honestas e diretas, segundo Camilo, ainda que elas sejam traçadas pelo único orelhão existente em Santa Fé. “Não chegou o celular ainda lá. Esse Nordeste onde não tem modernidade alguma é real e concreto”, ressaltou.

"A História da Eternidade" nasceu há 12 anos de um projeto que se iniciou com uma curta-metragem de mesmo nome. Durante todo esse tempo, Camilo criou dogmas e não abriu mão deles até a conclusão do filme. Uma das “teimosias” do cineasta se revelou como um dos momentos mais belos do filme.

A câmera não se move até que Joãozinho, o artista citado no início do texto e brilhantemente interpretado por Irandhir Santos, dança embalado por “Fala”, do Secos & Molhados, diante de um vilarejo conservador, chocando com tamanha ousadia. A partir daí, tudo passa a rodar em travellings. Durante a cena, a plateia de Paulínia aplaudiu, por três vezes, a beleza da sequência.

“Fiquei com receio de que os primeiros 50 minutos do filme se tornassem chatos por não ter nenhum movimento de câmera. Mas, valeu a pena. O resultado ficou potente e, quando a câmera roda, o público voa junto em uma sensação libertária”, definiu Camilo.

Este não foi o único ponto alto do filme, que também emocionou com o desejo de Alfonsina (Débora Ingrid) em finalmente conhecer o mar – ainda que de forma simbólica. Alfonsina, aliás, parece ser uma das poucas moradoras do vilarejo que consegue se livrar dos paradigmas do Sertão ancestral. Das Dores (vivida pela prestigiada atriz do teatro paraibano Zezita Matos) ainda precisa se autoflagelar logo após folhear uma revista pornográfica trazida por seu neto (Maxwell Nascimento, de Querô) vindo de São Paulo para se esconder no vilarejo após envolver-se com o crime na capital paulista.

Mesmo cercado por ótimas atuações do grande elenco, é mesmo Irandhir Santos quem rouba a cena. O ator, que não pode estar presente na coletiva, teve a genialidade de sua criação para o personagem de Joãozinho dissecada pelo diretor.

“Irandhir sempre mergulha fundo nas propostas”, afirmou Camilo. “Para o personagem, que é um artista epilético, ele se atentou aos detalhes e bordou uma uma camisa com nomes de artistas epiléticos conhecidos, além de ter criado um manto feito com caixas de remédios para tratar a doença”. O manto, aliás, está presente na cena em que Joãozinho dança ao som da voz de Ney Matogrosso.

A trilha é também um show a parte. Além de surpresas como “Forever”, do grupo Pholhas, e “Foi Você”, composição de Raul Seixas na voz e no ritmo brega de Marcio Greyck, “A História da Eternidade” conta com composições de Dominguinhos (1941 – 2013) e de Zbigniew Preisner, parceiro do diretor polonês Krzysztof Kieslowski (1941 – 1996).

(Karen Lemos - Revista O Grito!)

Lírio Ferreira filma paixão proibida entre irmãos em "Sangue Azul"


Sem produzir um longa-metragem desde 2005 e longe da ficção desde 2009, o pernambucano Lírio Ferreira estava sentindo falta de algo. “Queria ter gente se bulindo na minha frente de novo”, riu o cineasta ao enumerar os motivos que o levou a realizar "Sangue Azul", seu novo trabalho cuja estreia aconteceu na noite de sexta-feira (25) no Festival de Cinema de Paulínia, no interior de São Paulo, e foi dedicada à Ariano Suassuna (1927 – 2014).

“Eu tinha um desejo de filmar alguma coisa assim depois de tanto tempo fazendo documentários”, acrescentou Lírio, cujos últimos trabalhos foram "O Homem que Engarrafava Nuvens", sobre o compositor Humberto Teixeira, e "Cartola – Música para os Olhos", que foca na vida e obra de um de nossos mais célebres sambistas.

O diretor retorna à sua velha poesia cinematográfica – aquela que marcou o cinema brasileiro e trouxe destaque à produção pernambucana com "Baile Perfumado" em parceria com Paulo Caldas – ao contar a história de Zolah (Daniel de Oliveira), artista de circo que deixou a ilha na qual morava para ganhar o mundo se apresentando como o homem bala da trupe. Seu retorno à terra natal traz sombras do passado, entre elas, uma paixão proibida que nutre por sua irmã Raquel (vivida por Caroline Abras).

Não é um filme fácil. Indigesto em alguns momentos e altamente erótico em outros, poucos espectadores – desavisados sobre o tema do filme – levaram suas crianças e, no meio da sessão, deixaram a sala muito antes de seu término. Foram exceções. Grande parte do público permaneceu na sala praticamente lotada e aplaudiu a obra logo após sua projeção.

O cineasta Lírio Ferreira

A desistência de algumas pessoas da plateia já era algo esperado na visão do cineasta. “Fazer cinema é uma atividade de risco, é o sair da zona de conforto”, explicou. “Jogo minhas cartas e tento fazer com que façam sentido com o que propus no roteiro”.

Protagonista de grande parte das cenas mais quentes, Daniel de Oliveira saiu em defesa da obra: “As cenas foram colocadas no filme de forma bonita e natural. Em outros filmes que eu fiz, eu senti algo mais pesado. O Lírio é muito delicado para mostrar as coisas”, explicou o ator que, em 2009, gravou cenas de incesto entre pai e filho para A Festa da Menina Morta de Matheus Nachtergaele.

“Esse lugar vai me deixar louco” 

A ilha de Fernando de Noronha foi escolhida como cenário da trama. Suas belezas contrastam com os dramas de seus moradores e visitantes. “Esse lugar vai me deixar louco”, chega a dizer um dos artistas do circo no longa-metragem.

A forma como o local é apresentado é uma das mais belas já realizadas pelo cinema. O filme começa em preto e branco (quase temos a impressão que será assim ao longo da projeção), porém, com a explosão do canhão e o voo do homem bala, tudo ganha cores: o circo, a lona, a plateia e, em cenas posteriores, as árvores, a areia e o mar de Fernando de Noronha.

“Tinha um receio de filmar no paraíso e deslumbrar logo de cara”, explicou Lírio, que criou um artifício para não entregar logo os pontos. “Pensei em uma maneira de filmar os 15 minutos iniciais sem deixar o espectador inebriado com as imagens lindas da ilha”. A sequência veio de lembranças que Lírio guardou na mente. “Acho que vi isso acontecendo em Ivan, o Terrível, de [Sergei] Eisentein’”, recordou. Muitas das cenas foram pensadas assim, resgatando ricas referências de sua memória. “São os caboclos que descem”, brincou Lírio ao ser questionado sobre o assunto.

Sobre o tipo de arte que produz, Lírio foi enfático ao ressaltar sua preocupação (ou falta dela) com a obra viva e aberta. “Eu gosto de fazer um cinema solto”, definiu. “Talvez seja mais arriscado, mas gosto de deixar aberto, com buracos no meio, sem costurar, sem portas fechadas, sem certeza absoluta. Dá para assistir 'Sangue Azul' daqui 10 anos e perceber novas coisas”, pontuou.

"Sangue Azul" ainda traz em seu elenco Ruy Guerra, Paulo César Pereio, Milhem Cortaz e Matheus Nachtergaele em ótimas atuações coadjuvantes, além da premiada em Cannes Sandra Corveloni, que interpreta a mãe dos irmãos, responsável pela separação prematura de seus filhos ainda na infância. Vale destaque também a participação especial da cirandeira Lia de Itamaracá, que emociona ao cantar rodeada pelos personagens em um momento chave do filme.

(Karen Lemos - Revista O Grito!)