Foto: Clarice Castro/GERJ
A garantia de poder se casar com quem quiser foi associada com uma significativa queda das taxas de tentativa de suicídio entre jovens do ensino médio em um estudo da Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health, dos Estados Unidos, publicado em fevereiro deste ano.
O levantamento mostrou que em estados norte-americanos onde o casamento entre pessoas do mesmo sexo é legal, foram registradas 134 mil tentativas de suicídio a menos do que nos estados que não asseguravam este direito.
O estudo foi feito antes da decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos, que legalizou o casamento gay em todo o seu território nacional em 2015.
A pesquisa também revelou que 29% da população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros) do país afirmou ter tentado suicídio; a taxa entre jovens heterossexuais não passou de 6%.
“Fiquei tão impressionada com a diferença entre esses números que comecei a questionar o quanto a garantia de direitos pode estar relacionada com essa disparidade entre as tentativas de suicídio”, conta Julia Raifman, chefe da pesquisa e pós-doutoranda da Bloomberg School, em entrevista exclusiva ao Portal da Band.
“Os resultados foram consistentes com a nossa hipótese de que as políticas estatais de casamento entre pessoas do mesmo sexo podem estar associadas a tentativas de suicídio de adolescentes”, disse ainda a pesquisadora, que espera que esse estudo chame atenção para que outros países protejam a saúde de seus jovens LGBTs.
Suicídio no Brasil e no mundo
De acordo com dados mais recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS), o suicídio é responsável por uma morte a cada 40 segundos no mundo. Em 2015, foram mais de 800 mil suicídios registrados pelo órgão.
Entre jovens com idade entre 15 a 29 anos, o suicídio é a segunda principal causa de morte, sendo que os números crescem ainda mais em populações que sofrem discriminação, como é o caso de refugiados, imigrantes, negros, indígenas e LGBTs.
No Brasil, a taxa média de suicídio é de cinco por 100 mil habitantes, segundo informações do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), mas não há um recorte para a população LGBT, o que dificulta um levantamento mais específico.
União homoafetiva no Brasil
Desde maio de 2013, o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo no Brasil é assegurado por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e pela Resolução nº 175 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Nesta quarta-feira (8), a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal aprovou um projeto de lei que altera o Código Civil para reconhecer a união estável entre pessoas do mesmo sexo e possibilitar a conversão dessa união em casamento. A proposta segue para votação na Câmara dos Deputados e pode enfrentar dificuldades, já que a composição da Casa é considerada conservadora.
Apesar das pequenas vitórias conquistadas com muito esforço, nosso país ainda é um dos que mais matam LGBTs - e o que mais mata transexuais - no mundo. Um projeto de lei que visava criminalizar a homofobia, por exemplo, foi arquivado no Senado.
Tudo isso colabora para uma piora da saúde psíquica dos homossexuais no Brasil, como explicam especialistas ouvidos pela reportagem.
Reconhecimento do Estado
“A homofobia no Brasil é caracterizada como uma violência de fora para dentro, mas as pessoas também se matam por causa da homofobia”, ressalta Pedro Paulo Bicalho, diretor do Conselho Federal de Psicologia e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ao Portal da Band.
Segundo o especialista, garantir direitos (como o casamento civil) e proteção (que se daria com a criminalização da homofobia) estão diretamente relacionados à existência de um cidadão dentro da sociedade. “A pessoa passa a sentir-se reconhecida pelo Estado, e isso aumenta incrivelmente a sensação de bem estar e da qualidade psíquica, além de reduzir a prevalência de suicídio”, observa.
O reconhecimento do Estado, aliás, reverbera em outras esferas da sociedade, como no trabalho, na escola e no círculo familiar. “O apoio e a aceitação da sociedade como um todo é um aspecto muito importante para a manutenção da saúde mental do indivíduo”, destaca a psicóloga Fernanda Carito em conversa com a reportagem.
A especialista lembra ainda que, muitas vezes, o suicídio é uma forma de tentar resolver um problema em que não se enxerga solução. “É uma esquiva do sofrimento e não apenas um desejo de morrer”, resume. “O que gera sofrimento psíquico não é a orientação sexual em si, mas como a sociedade a enxerga, tratando como um problema uma característica que é apenas diferente do que consideram como aceitável”, conclui.
(Karen Lemos - Portal da Band)
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