domingo, 24 de janeiro de 2016

Artistas sírios recriam monumentos do país destruídos pelo Estado Islâmico

Christopher Herwig/UN Refugee Agency

Mais triste do que abandonar seu próprio país é ver a sua história sendo, aos poucos, apagada para sempre. Essa é a sensação que artistas de um campo de refugiados da Jordânia compartilham.

Como muitos sírios, eles tiveram que fugir de sua terra natal, imersa em uma sangrenta guerra civil que já dura mais de quatro anos; agora, eles se veem obrigados a assistir de longe o avanço do Estado Islâmico e o rastro de destruição que os jihadistas deixam pelo caminho.

Indignados, porém impotentes diante da devastação, o grupo decidiu usar as habilidades que possui para tentar manter viva a memória da Síria, cujos monumentos históricos estão em ruínas ou extintos devido à ação dos terroristas.

“Esses monumentos não representam apenas o passado de nosso país, também representam a história e a cultura da humanidade”, diz Mahmoud Hariri, artista que construiu o Templo de Bel - recentemente destruído pelo Estado Islâmico, em Palmira – com argila e espetos de madeira. “Muito do que sabemos sobre as antigas civilizações se deu devido à arte”, completa.

Christopher Herwig/UN Refugee Agency

Outros dos monumentos foram recriados dessa forma, com qualquer material que os artistas possam encontrar, como madeira, pedras e isopor, como o Krak dos Cavaleiros, em Homs, uma das cidades mais atingidas pela guerra civil síria.

Assim, o grupo espera que o trabalho chame a atenção do mundo para o que está acontecendo na Síria e ajude os refugiados que fogem de lá para salvar suas próprias vidas.

Outro artista do grupo, Ahmad Hariri também acredita que essas obras terão importância substancial para as crianças do campo de refugiados onde atualmente moram. “Muitas delas nunca tiveram a chance de ver a Síria, quanto mais de guardarem alguma memória do país”, lamenta.

(Karen Lemos - Portal da Band)

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Transexuais concluem o ensino básico e agora vislumbram universidade

Participantes do primeiro ano do programa Transcidadania (Wagner Origenes Nunes/Divulgação)

Quinze anos atrás, Marcela Monteiro foi praticamente expulsa da escola em que estudava. Os motivos não eram mau comportamento ou notas baixas. Transexual, Marcela foi ameaçada por um grupo de colegas que não aceitava sua presença no sistema de ensino.

“Os meninos do grupo disseram que iam colocar fogo em mim. Só me salvei porque um professor me colocou no porta-malas dele para que eu conseguisse fugir”, lembra.

Hoje, aos 34 anos, Marcela conseguiu voltar a estudar e vislumbra um novo horizonte em que é possível escolher uma profissão longe das ruas e da prostituição. "Meu sonho é ser assistente social", conta. Ela é uma das 100 transexuais que concluíram o primeiro ano do Transcidadania, programa da Prefeitura de São Paulo que oferece conclusão dos ensinos fundamental e médio, além de cursos como Mercado de Trabalho e Direitos Humanos.

“O programa fez com que nós voltássemos a nos enxergar com dignidade. Voltar para a escola é voltar a se sentir como uma cidadã e, automaticamente, mostrar para a sociedade que nós existimos e precisamos ser respeitadas”, relata.

Das participantes do primeiro ano do programa, 33 completaram o ensino fundamental e cinco, o ensino médio. Dessas cinco, duas obtiveram notas no Enem suficientes para ingressar em uma universidade através de programas como o Sisu e o ProUni.

“Isso é uma vitória se pensarmos que o Brasil é o país que mais mata travestis no mundo todo”, ressalta Alessandro Melchior, coordenador de Políticas LGBT da Prefeitura.

Wagner Origenes Nunes/Divulgação

Em 2016, o programa terá continuidade com mais 100 vagas para transexuais, além de uma bolsa no valor de R$ 910,00, permitindo que os participantes se dediquem exclusivamente aos estudos. “Muita gente criticou o programa, às vezes por ignorância, por não saber como é a vida dessas pessoas. O fato de abrirmos novas vagas é uma resposta à altura para essas críticas”, pontua o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad.

“Nosso objetivo é um dia não precisar mais de programas como esse. O dia em que isso acontecer, é porque temos uma sociedade onde qualquer pessoa pode frequentar a escola, assumir sua identidade e escolher sua profissão. Enquanto isso não ocorre, continuaremos com o Transcidadania”, compromete-se Haddad.

Os resultados positivos fizeram com que a iniciativa chegasse até outros municípios. Nesta semana, a Secretaria de Direitos Humanos de Minas Gerais anunciou um projeto voltado para as transexuais do Estado, e, segundo Eduardo Suplicy, é possível que o modelo atravesse fronteiras.

“Estive com o embaixador americano para direitos humanos da população LGBT, Randy Barry, durante sua visita ao Brasil. Ele se emocionou muito ao ouvir os depoimentos da população transexual, tanto que convidou nosso coordenador Alessandro Melchior para visitá-lo nos Estados Unidos e conversar sobre o programa”, celebra Suplicy, secretário de Direitos Humanos de São Paulo.

(Karen Lemos - Portal da Band)

sábado, 9 de janeiro de 2016

Movimento cria petição pedindo que mulheres possam descer fora do ponto de ônibus no período noturno

Pedro Ventura/Agência Brasília

O movimento “Vamos Juntas?”, que propõe que mulheres andem juntas na rua por segurança, quer levar ao Congresso Nacional uma proposta de lei permitindo que usuárias do transporte público possam descer fora dos pontos de ônibus após às 22h.

A intenção do coletivo é pegar a ideia, originalmente criada no Distrito Federal, já existente em âmbito municipal e expandi-la para todo o território brasileiro.

“A gente recebe muitas histórias, uma média de 100 por dia e, em algumas delas, mulheres de todo o Brasil – tanto de grandes como de pequenas cidades – relatam a insegurança que sentem quando o ponto de ônibus fica longe e elas precisam voltar de noite para casa”, conta Babi Souza, idealizadora do “Vamos Juntas?”, ao Portal da Band.

Diante desse cenário, o movimento está recolhendo assinaturas online em uma petição para dar peso à proposta que, posteriormente, será levada até algum parlamentar que abrace a ideia e proponha a pauta no Congresso.

A intenção é que uma lei como essa possa amparar mulheres que trabalham ou estudam à noite e ficam suscetíveis a crimes de violência de gênero, como aconteceu com a pernambucana Maria*, com 15 anos na época. “Sofri abuso sexual no percurso de uma festa para minha casa”, relata à reportagem.

“Eu estava sozinha, foi muito perto de onde eu moro, quase na minha esquina. Mesmo estando tão perto da minha casa, não estava imune ao que me aconteceu. Desço do ônibus a uns 150 metros da minha casa e na rua em que fui abusada não passa ônibus. Imagino que há tantas outras meninas que moram a uma ou duas quadras da parada de ônibus e precisam ir sozinhas, por trechos perigosos, para chegar às suas casas.” Para a vítima, fazer com que esse percurso seja o mais curto possível não custa nada. “Não há razões para alguém ser contra uma medida que só vai ajudar essas garotas e, também, suas famílias.”

Dados 

Segundo a ONU, sete em cada dez mulheres no mundo já foram ou serão violentadas em algum momento da vida. No Brasil, em 2014, ao menos 47.646 estupros foram registrados, o equivalente a um caso em cada 11 minutos. Dados da OMS e do IBGE colocaram o país na sétima posição do ranking mundial de assassinato de mulheres (4,4 homicídios em 100 mil mulheres), sendo o maior índice registrado entre mulheres de 18 anos.

“As principais vítimas são mesmo meninas jovens, que estudam, fazem cursinho, faculdade [no período noturno]; algum fato já aconteceu com a maioria delas no trajeto de volta para casa”, lembra Babi Souza, do “Vamos Juntas?”

Na proposta do movimento, também está inclusa a possibilidade de estender o benefício para os homens. “Mas a preocupação emergencial é com as mulheres, que são as que mais sofrem e temem a violência sexual”, esclarece.

Distrito Federal 

No dia 29 de março de 2014, o governo do Distrito Federal publicou um decreto estabelecendo que, após às 22h, mulheres poderão descer dos ônibus fora do ponto de parada. Empresas que não seguem a determinação estão sujeitas à multa.

O decreto não veio à toa. O último relatório disponível pela Secretaria de Segurança Pública do município mostra que, em agosto de 2013, foram registradas 79 ocorrências de estupro. O número, claro, é bem maior, já que muitas das vítimas não registram boletim de ocorrência.

O relatório também revela que o horário de maior frequência dos abusos é justamente no período da noite, que compreende das 18h às 23h59, concentrando 34,2% dos casos


“Não tivemos, desde que o decreto foi publicado, nenhuma reclamação de usuárias que sofreram abusos sexuais. Se não há reclamação, é porque a coisa está funcionando, acredito”, diz o diretor-geral do DFTrans, Léo Carlos Cruz, ao Portal da Band.

Cruz também alega não ter recebido nenhuma crítica dos usuários com relação ao benefício ser exclusivo para mulheres. De acordo com o diretor-geral, os ônibus do Distrito Federal circulam com informativos fixados sobre o decreto. Até o momento, segundo ele, nenhuma empresa foi multada por não ter cumprido com a nova determinação.

Questionado sobre o decreto ser ampliado e virar lei nacional, Cruz pondera. “Tenho receio de que, em algumas cidades, essa lei não pegue. Acho que o ideal é analisar a realidade de cada município e perceber a necessidade de implementar essa regra. Aqui, funciona muito bem”, pontua.

*Por questões de segurança, a vítima preferiu não se identificar. 

(Karen Lemos - Portal da Band)