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Toda semana, de forma antagônica, dezenas e por vezes até centenas de mulheres formam fila em frente de penitenciárias; madrugam, carregam quilos de alimentos, produtos de higiene e até vestuário e, em muitas unidades, enfrentam uma revista vexatória apenas para ficarem algumas horas na companhia de quem amam.
Por conta desse esforço, elas recebem o nome de guerreiras. Assim são chamadas as namoradas, noivas e esposas de detentos do sistema penitenciário brasileiro. A realidade desse amor separado pelas grades é retratado de forma sensível no documentário “Cativas – Presas pelo Coração”, em cartaz no Caixa Belas Artes, de São Paulo.
Em conversa com o Portal da Band, a diretora Joana Nin, que passou 12 anos em cima desse projeto, explicou que queria mostrar a importância dessas mulheres para a recuperação do preso. “Elas são vistas com muito preconceito. Muitos acham que elas estão lá para levar drogas ou celular para dentro do presídio. Eu já vejo diferente. Eu acho que elas estão lá para levar afeto, amor, que é o sentimento transformador da humanidade.”
“Cativas” acompanha sete mulheres que se relacionam com presidiários. As histórias são diferentes, mas os sentimentos tão comuns dos casais apaixonados estão lá. “Essas relações amorosas são iguais as nossas. Tem os mesmos problemas e belezas. Todo mundo quer ser amado, não importa onde e em quais condições”, completa Joana.
Revistas e visitas íntimas
Ao longo dos 12 anos, a cineasta conseguiu a confiança do sistema, das mulheres e dos presos. Isso lhe permitiu ser mais ousada e ir além do pouco que enxergamos por trás das grades. Em uma das cenas, por exemplo, Joana filma momentos de intimidade de um casal durante a visita íntima.
“Eu já estava tão imersa na intimidade desse casal que propus fazer a cena”, conta. “Algumas dessas mulheres reclamam que muitos pensam que elas são putas, que vão ao presídio apenas para dar para o cara e não é isso! A cena não é de sexo explícito, é de romance.”
Em outra sequência, Joana consegue acompanhar a revista das mulheres que chegam para a visita. Em agosto de 2014, o Conselho Nacional de Política Criminal Penitenciária editou uma resolução que recomenda a extinção da revista vexatória em todo o país. Ainda assim, elas continuam existindo, cada uma de forma diversa, já que cada unidade prisional tem as suas próprias regras.
No presídio em que Joana filmou, as mulheres precisavam, além de ficar totalmente nuas, agachar em cima de um espelho sob os olhares das agentes penitenciárias. “Coloquei essa cena porque eu acho que isso que tem que acabar”, afirmou a cineasta.
Como cada unidade segue suas próprias leis, cabe a quem participa do sistema denunciá-lo. Esse é outro ponto que destaca a função das guerreiras. “Poucas vezes vi pessoas querendo mudar algo lá dentro. Só quem tem família quer essa mudança”, afirma Joana.
Sobre o estigma que o preso carrega por toda a vida e as dificuldades da ressocialização, a cineasta é enfática: “Não sou ingênua de achar que o preso que tem família vai sair do crime, mas tenho a convicção de que o preso que não tem ninguém por quem zelar, certamente vai voltar para o crime.”
Joana acredita que valorizando as guerreiras, a porcentagem de reincidência da população carcerária pode cair. “Vivemos em uma sociedade hipócrita que prefere fingir que as coisas não existem. Mas o negócio é o seguinte: no Brasil, temos uma legislação em que a pessoa fica presa por no máximo 30 anos. Quer você queria, quer não, ela voltará ao nosso convívio. Temos a opção de fazer esse retorno ser mais ou menos traumático”, conclui.
(Karen Lemos - Portal da Band)
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