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O mundo acompanha com apreensão os desdobramentos na Itália, que enfrenta o pior surto de coronavírus durante a pandemia da doença. No Brasil, os profissionais de saúde vivem ainda a ansiedade de passar por algo do tipo. “É o medo de precisar escolher entre quem vai viver e vai morrer - algo que está ocorrendo na Itália, de não poder faltar no trabalho, do que fazer com os filhos que estão em casa já que as aulas estão suspensas. É uma angústia generalizada”, relata Marina Bragante.
Bragante faz parte de um grupo de psicólogos que se uniu e criou uma plataforma online na qual profissionais da saúde, tanto os que trabalham para o Sistema Único de Saúde (SUS) quanto os da rede privada, podem ter acesso à apoio psicológico de forma totalmente gratuita.
“Pensamos em uma espécie de Tinder entre profissionais de saúde em busca de ajuda e psicólogos voluntários dispostos a oferecer esse apoio”, acrescentou a psicóloga, que trabalhou na ideia junto com Camila Munhoz, Evelyse Stefoni de Freitas Clausse, Luciana Lafraia e Jonas Boni. A iniciativa também teve apoio do gabinete da deputada estadual Marina Helou (Rede-SP), de Evelyn Gomes, do Cuidame, e do Nossas, e também conta com a expertise de Angela Carvalho de Freitas, médica infectologista do Hospital das Clínicas FMUSP.
Perto do limite
O grupo trabalhou pesado nos últimos dias para lançar a plataforma o quanto antes. Segundo Bragante, os impactos do surto de coronavírus já estão sendo sentidos por médicos e enfermeiros da rede de saúde do Brasil. “Começamos a escutar coisas do tipo ‘vou pedir exoneração’, ‘vou me demitir’, ‘não vou aguentar’, ‘preciso de remédios’”, alerta. “Nós já estamos perto do limite e ainda nem chegamos no auge da curva de casos da doença”.
O apoio psicológico para esses profissionais que estão na linha de frente do combate ao Covid-19 é tão essencial quanto o tratamento médico que eles têm a oferecer para a população.
“O medo não precisa ficar com você; pode ser compartilhado com outras pessoas capazes de te ajudar. Entender o que está acontecendo, se ouvir falar sobre o assunto, ajuda a te fortalecer para o que vem pela frente”.
Cuidando do batalhão de voluntários
Para formar a equipe de voluntários, o grupo enviou mensagens em aplicativos convidando psicólogos interessados, com registro no conselho de psicologia e com pelo menos quatro horas – não necessariamente consecutivas - disponíveis para o trabalho em um período semanal.
“Nós achávamos que umas 20 pessoas do nosso círculo de amigos responderia à convocação. Quando abri o e-mail do projeto, tinha mais de duas mil mensagens no começo. Agora já são quase 5 mil”, conta Marina Bragante.
Por enquanto, a plataforma está trabalhando com psicólogos de São Paulo, já que é preciso conferir o número de registro dos profissionais no conselho regional. Mas, diante da oferta de profissionais em todo o País, as fundadoras já estão em contato com conselhos de outros Estados para tornar a plataforma nacional. Com a alta oferta para vagas voluntárias, a ideia também é que a ferramenta possa funcionar 24 horas por dia.
E para lidar com os impactos que os próprios psicólogos terão nesse trabalho, Marina Bragante e suas colegas também tiveram a preocupação de ceder ajuda aos voluntários, que vão acabar absorvendo um pouco da angústia compartilhada pelos médicos e enfermeiros.
“Vamos dar apoio com o que chamamos de supervisão – um psicólogo mais experiente para atender os voluntários. Também teremos grupos de conversa entre eles e vamos oferecer textos de psicólogos que já atuaram em situações de crise e calamidade, como em guerras e em surtos de outras doenças, como o ebola, por exemplo”, acrescentou.
Saúde mental
Esse tipo de cuidado não é somente os médicos e enfermeiros que devem ter, mas todos da sociedade. Marina Bragante reforça algumas ideias que ajudam a superar situações difíceis, ainda mais nesse momento que é de incertezas e limitações pessoais.
“Entenda que o isolamento é físico, e não social. Temos internet, telefone; é preciso manter contato com as pessoas que gostamos, e isso faz bem. Ligue, faça chats em vídeo, chamadas por Skype. Esses dias uns amigos meus fizeram um ‘risotalk’; eles cozinharam risoto e, depois, fizeram uma chamada de vídeo e todos comeram juntos, mas cada um em sua casa”, exemplificou. “Manter a vida social ativa, ainda que de forma diferente, é importante”.
Entre outras dicas da psicóloga está manter uma rotina, a casa limpa e em ordem, e fazer exercício físico. “O exercício ajuda a liberar endorfina [hormônio que dá sensação de bem estar] e cansar o corpo, sentir que estamos vivos”, disse.
Sessões de autocuidado, como meditação, ou até uma hidratação nos cabelos, fazer a unha, algum hobby como desenhar ou colorir, também ajudam. É bom ainda limitar o acesso às informações durante o dia e evitar as notícias falsas e áudios alarmantes (normalmente também falsos) que costumam a rodar por grupos de WhatsApp.
Dormir bem e se alimentar bem é essencial, além de fortalecerem a imunidade. E o mais importante: se precisar, peça ajuda. “Tudo bem ficar com medo, você não precisa passar por essa situação sozinho. Tudo bem pedir ajuda. É bom pedir ajuda, faz parte e é saudável”.
Acesso à plataforma:
https://www.rededeapoiopsicologico.org.br/
(Karen Lemos - Portal da Band)