Foto: Ricardo Stuckert
Estamos em ano de eleições e, embora o pleito ainda esteja meses adiante, o mundo político vive um frenesi excepcional com a aproximação do julgamento em segunda instância do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre.
Nesta quarta-feira (24), a 8ª Turma da Corte vai analisar a apelação criminal que envolve Lula no caso do tríplex no Guarujá. O julgamento é essencial para a corrida presidencial do petista, já que existe o risco de a decisão do TRF4 torná-lo inelegível e inapto a concorrer nas eleições deste ano, ou até mesmo de fazer cumprir a pena estabelecida em primeira instância: nove anos e meio de prisão.
Como será o julgamento
O julgamento terá início às 8h30 desta quarta na sala da 8ª Turma, localizada no TRF4, na capital gaúcha. Além da apelação de Lula, há recursos de mais seis réus a serem analisados.
O processo, o único da sessão do dia, começa com a abertura do presidente da Turma, o desembargador Leandro Paulsen. Na sequência, o relator do caso, o desembargador João Pedro Gebran Neto, faz a leitura do relatório. Depois, o Ministério Público Federal se manifesta por 30 minutos, seguido pelos advogados de defesa de Lula e demais réus, que terão 15 minutos para cada indiciado, totalizando uma hora de sustentações orais da defesa.
Logo após, o relator Gebran Neto lê o seu voto. O revisor, o desembargador Leandro Paulsen, também manifesta seu parecer, seguido da leitura de voto do desembargador Victor Luiz dos Santos Laus. A palavra volta, então, para Paulsen, presidente da Turma, que profere o resultado do julgamento.
A qualquer momento, vale lembrar, pode haver pedido de vista e, nesse caso, uma nova data para o julgamento será marcada.
Apesar de a sessão ser pública, o acesso à sala onde ocorrerá o julgamento fica proibido, a não ser pelas partes envolvidas e seus advogados. O julgamento, entretanto, será transmitido ao vivo e poderá ser acompanhado no Portal da Band.
Lula estará presente na sessão?
A presença do ex-presidente Lula no julgamento que definirá seu destino político nessas eleições ainda é uma incógnita. O petista não é obrigado a ir e, caso o faça, não deve se manifestar perante o tribunal, já que seus advogados é que falarão em seu nome.
Tudo indica, no entanto, que ele não estará em Porto Alegre uma vez que um ato em sua defesa foi agendado para acontecer na Avenida Paulista, em São Paulo, nesta mesma data. Lideranças do PT dizem que Lula marcará presença neste protesto.
Mesmo com poucas probabilidades de que o ex-presidente vá a capital gaúcha, a Secretaria Estadual da Segurança Pública preparou um esquema de segurança em torno do prédio prevendo manifestações contra e a favor de Lula. O objetivo é cuidar do isolamento da área e garantir que não haja conflitos e depredações na cidade. Além disso, os desembargadores relataram ameaças e pediram à ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), reforço na segurança no local.
Fora das eleições?
Com base na Lei da Ficha Limpa, que impede que condenados em segunda instância se candidatem às eleições, Lula pode ficar inelegível se o TRF4 confirmar a sentença, mesmo que a defesa ainda possa recorrer da decisão.
"Quem determina a inelegibilidade é o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas isso não ocorre de forma prévia. Somente após o registro da candidatura de Lula é que a aplicação dos efeitos da Lei da Ficha Limpa é analisada", explica Cristiano Vilela, membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP, ao Portal da Band.
Até que essa questão seja apreciada pelo TSE, Lula pode seguir em campanha e até participar de debates. Se a candidatura do petista for impugnada até 20 dias antes das eleições, o PT ainda consegue substituir seu candidato para a corrida eleitoral, caso contrário, o partido fica sem poder apresentar um nome para o pleito.
O ex-presidente Lula tem liderado as pesquisas de intenção de voto em vários cenários. Por isso, caso o petista vença as eleições presidenciais deste ano, há uma preocupação com sua diplomação como presidente. Se o petista ficar inelegível antes da posse, a diplomação pode ser anulada e existe a possibilidade de novas eleições serem convocadas.
"É uma hipótese difícil de acontecer, porque impedir um presidente de tomar posse é algo bem delicado. Sendo assim, Lula pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal alegando que suspender seus direitos políticos é inconstitucional e, dessa forma, garantir que seja empossado", pontua Vilela. "É pouco provável, porém, que o STF tome uma decisão antes da posse em si. A análise dessa questão pode demorar anos."
Uma vez empossado, Lula não mais responderia pela condenação já que a Constituição garante que “o presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”. O político, portanto, cumpriria a pena somente após concluir o mandato.
Afinal, Lula pode ir preso?
Essa possibilidade existe, sim. Em 2016, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o réu já pode começar a cumprir pena após condenação em segunda instância. "Em contrapartida, o próprio STF reconhece que enquanto a defesa puder interpor recursos, o réu não vai preso", observa Rogério Cury, especialista em Direito Penal.
Há duas apelações disponíveis para que a defesa evite a prisão de Lula:
Embargos de declaração – os advogados do ex-presidente podem lançar mão desse recurso para pedir esclarecimentos sobre a decisão final dos desembargadores do TRF4.
Embargos infringentes – esta apelação é usada pela defesa caso a decisão seja contra o réu e não unânime. Se o placar fechar em 2x1 pela condenação de Lula, os advogados podem pedir que o voto favorável ao ex-presidente prevaleça.
"Os advogados de Lula conseguem ainda solicitar outro embargo de declaração, mas existe a possibilidade de o tribunal considerar o pedido protelatório e exigir que a pena seja cumprida imediatamente", observa o especialista.
Por fim, é possível que Lula recorra aos tribunais superiores, como o STF ou o Superior Tribunal de Justiça (STJ), para reverter o pedido de prisão. "O STF ou o STJ pode admitir a execução da pena após julgamento em instâncias superiores, até porque a nossa Constituição considera o trânsito em julgado [decisão definitiva da Justiça, quando não cabem mais recursos] para o cumprimento de pena, salvo medidas cautelares, o que não é o caso de Lula."
Condenação
O ex-presidente Lula foi condenado pelo juiz Sérgio Moro a nove anos e meio de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso envolvendo o tríplex no Guarujá, em São Paulo. A sentença é decorrente de uma denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) em setembro de 2016.
Segundo as investigações da Operação Lava Jato, Lula teria recebido R$ 2,2 milhões de propina, provenientes de contratos entre a empreiteira OAS e a Petrobras, por meio do apartamento localizado no litoral paulista e reformas neste imóvel.
“Do montante da propina acertada no acerto de corrupção, cerca de R$ 2.252.472,00, consubstanciado na diferença entre o pago e o preço do apartamento tríplex (R$ 1.147.770,00) e no custo das reformas (R$ 1.104.702,00), foram destinados como vantagem indevida ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva”, afirma Moro.
A defesa de Lula nega todas as acusações.
(Karen Lemos - Portal da Band)