quinta-feira, 27 de abril de 2017

Greve geral mostra que governo Temer subestimou as centrais sindicais, diz analista

 Beto Barata/PR

A expectativa de uma ampla adesão à greve geral contra as reformas do governo de Michel Temer (PMDB), programada para esta sexta-feira (28) em todo o país, pode ter um impacto significativo na votação dos carros-chefes do Executivo, como é o caso da Reforma da Previdência, que será apreciada na comissão especial da Câmara dos Deputados no dia 2 de maio, e da Reforma Trabalhista, aprovada em plenário nesta quarta-feira (26) e que agora segue para votação no Senado Federal.

Na opinião do especialista Thomaz Favaro, Temer desconsiderou o fator de influência das centrais sindicais, que devem se unir para a paralisação desta semana.

“A greve mostra que o governo subestimou o poder de mobilização das centrais sindicais; vale lembrar que, até o ano passado, o movimento estava dividido entre as centrais mais ligadas aos partidos de esquerda, como a CUT e outras, e as de perfil político mais moderado, como é o caso da UGT e a Força Sindical. Temer pensou, então, que manteria apoio das centrais mais governistas, mas a alta adesão à greve indica que o governo errou neste cálculo”, explica o diretor-associado da Control Risks para o Brasil e Cone Sul.

Para Favaro, isso aumenta a pressão nos parlamentares que estão avaliando as duas principais propostas do Executivo.

Cenários possíveis

Tal pressão não deve, porém, alterar radicalmente o texto de ambas as reformas, segundo as projeções do analista. A exemplo da Reforma da Previdência, algumas alterações foram consideradas durante seu processo de tramitação no Congresso, mas o cerne da questão se manteve. "Ainda assim, existe o risco de a greve aumentar tanto a tensão a ponto de o texto ser distorcido”, pontua o analista.

Ato de protesto contra as reformas na Esplanada dos Ministérios (Foto: José Cruz/Agência Brasil)

Favaro trabalha com três cenários, sendo o mais improvável a cassação de Michel Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que atualmente julga as contas de campanha da chapa do peemedebista com a ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

O cenário alternativo que o especialista enxerga seria justamente aquele em que o governo não consegue aprovar suas reformas por perda de capital político. “As dissidências dentro da base governista aumentariam e o governo ingressa em um quadro que os norte-americanos chamam de lame duck, que é quando o Executivo já gastou sua relação com o Congresso e entra em um período de baixa produtividade.”

A projeção mais certa, todavia, continua sendo favorável ao presidente. “As circunstâncias mostram que o governo ainda possui condições de conseguir o número de votos necessários para aprovar as reformas até provavelmente o mês de setembro.”

Economia e Lava Jato

Mesmo não sendo o mais provável, Michel Temer pode perder o razoável capital político que possui por outros motivos alheios à greve desta sexta.

“A expectativa para este ano é de recuperação econômica, mas isso se dará de forma lenta e não deve influenciar positivamente, ao menos de forma significativa, no capital político do presidente”, avalia o analista de risco.

“Além do mais, o governo ainda rema contra a maré em outros aspectos, como na questão da investigação da Lava Jato, que implica em vários membros governistas. A aprovação antecipada das reformas seria, portanto, o cenário mais desejado pelo Executivo neste momento.”

Comunicação falha

Thomaz Favaro considera que o governo Temer enfrenta dificuldades para aprovar seus projetos por não ter se comunicado de forma mais efetiva, inclusive com os próprios parlamentares. Nesta semana, o PSB fechou questão contra a Reforma Trabalhista e da Previdência.

“Acredito que parte dessa culpa recai sobre os articuladores do governo no Congresso. Vale lembrar que, logo no começo, Temer perdeu alguns de seus principais articuladores devido a escândalos de corrupção, como foi o caso de [Romero] Jucá”, destaca.

“Vejo também uma falha no diálogo com a população brasileira. Não é fácil entender o tamanho do déficit das finanças públicas no Brasil e as projeções de crescimento de dívida; são proporções difíceis de serem compreendidas.”

(Karen Lemos - Portal da Band)

sexta-feira, 7 de abril de 2017

Os desafios de uma vereadora jovem, mulher e bissexual na Câmara Municipal de São Paulo

André Bueno/CMSP

 A relação com a política começou dentro de casa. Com os pais, que sempre foram militantes, aprendeu a importância de defender uma sociedade mais justa; aprendeu também que isso é algo que não se conquista assim tão facilmente, que demanda muito esforço. Foi na rua, porém, durante as manifestações de 2013, que entendeu que essa luta valia mesmo a pena, apesar de todas as barreiras que encontraria nesse caminho.

Em um mandato de 30 dias como suplente do vereador Toninho Vespoli (PSOL), barreiras não faltaram para Isa Penna, afinal, estamos falando de uma parlamentar jovem, mulher e bissexual atuando na Câmara Municipal de São Paulo, a maior do País, formada em 80% por homens, alguns deles com posições conservadoras em relação ao papel da mulher na sociedade.

Logo na primeira semana, a advogada de 26 anos se envolveu em um caso de agressão com o colega Camilo Cristófaro (PSB). O ocorrido, que está sendo investigado em um processo de sindicância aberto na Casa, foi definido por Isa como um símbolo da reação que ela causou neste ambiente político majoritariamente masculino.

“A impressão que têm é que eu não sirvo para a política por fugir do padrão de comportamento esperado de mim: o de uma menina meiga, submissa, que se intimide fácil. E quando eles [colegas parlamentares] percebem que não é por aí, o incômodo é nítido”, conta a vereadora, que na última semana de mandato recebeu o Portal da Band em seu gabinete.

Semideuses

Em uma decisão coletiva dentro do partido, ficou definido que Isa Penna ocuparia o cargo de vereadora durante licença de Vespoli a partir do dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, em um período de 30 dias. “Era importante ter uma bancada feminina e feminista no mês da mulher”, explica Isa, que compõe a bancada da legenda ao lado de Sâmia Bomfim.

Questionada a respeito de suas primeiras impressões sobre a Câmara dos Vereadores, a parlamentar fez um comparativo com o monte Olimpo, morada dos deuses da mitologia grega. “Os deuses do Olimpo tinham uma relação descolada dos terrestres, assim como os vereadores têm das reais demandas do povo.”

“Percebo a postura parlamentar como uma postura de um semideus, de alguém inatingível, confortável para atuar de forma politicamente incorreta. A própria dinâmica na Câmara, com o poder que fornece aos vereadores, contribui para essa lógica”.

Casa do machismo


Para Isa Penna, o machismo na Câmara Municipal de São Paulo se expressa de forma “desavergonhada”. Alguns dados ajudam a revelar o cenário por trás dessa percepção.

Na Câmara de São Paulo, são 11 parlamentares mulheres e 55 parlamentares homens, o que representa 20% de bancada feminina na Casa - um número alto se nos basearmos na história, mas muito abaixo da representatividade ideal se levarmos em conta que 51,4% da população brasileira são mulheres.

Em âmbito nacional, o número é ainda menor. De acordo com um levantamento da Inter-Parliamentary Union (IPU), que mede a representatividade nas instituições de poder, a Câmara dos Deputados, em Brasília, tem 10,7% de mulheres. Só para fazer uma comparação, a Arábia Saudita, país que somente em 2015 permitiu que suas mulheres votassem e se candidatassem, tem 19,9% de representação feminina em seu Legislativo.

“O comportamento machista de intimidar, de interromper, de inferiorizar, de desqualificar, é o tempo todo aqui na Câmara”, conta a vereadora, levando em consideração sua experiência de 30 dias na Casa. “Se não é isso, é a sedução. Ouço coisas do tipo ‘como você está bonita’, ‘você é muito bonita para estar na política’ ou então me chamam para jantar. Claro que não dá para generalizar, mas esse comportamento condiz com ao menos 80% dos parlamentares daqui”.

Vereadoras contra a violência de gênero

Ser uma “estranha no ninho” não é a única causa das desavenças com alguns parlamentares da Câmara. As pautas que defende em plenário, acredita Isa, também motivam conflitos lá dentro. “Eu defendo os direitos de pessoas historicamente marginalizadas, caso das mulheres, dos negros, da comunidade LGBT, dos indígenas, dos imigrantes; e isso muitas vezes é mal visto”, pontua.

A parlamentar crê que esse desencontro ideológico a torna, em algumas circunstâncias, um alvo dentro da Casa. Talvez isso explique um dos motivos que causaram a briga com Camilo Cristófaro, por exemplo. Um dia antes do ocorrido, Isa havia feito um discurso em plenário se posicionando contra a Reforma da Previdência do Governo Federal.

Isa alega que no dia seguinte foi abordada pelo colega, que a xingou de “vagabunda” e “terrorista”; Cristófaro teria dito ainda para ela não se surpreender se “tomar uns tapas” na rua. Em sua defesa, o vereador, que confirmou ter se encontrado com a parlamentar, disse que as acusações são mentirosas.

Vídeo mostra discussão entre Isa e Camilo na Câmara Municipal:



A vereadora, no entanto, não foi a única servidora com um caso de agressão na Câmara. No começo do ano, Juliana Cardoso (PT) relatou hostilidade da equipe de Fernando Holiday (DEM). Segundo ela, assessores do parlamentar invadiram a sala da liderança do PT e agrediram verbalmente e “com tapas” quem estava lá. Na ocasião, Holiday afirmou que não tinha conhecimento da ação de seus assessores.

“Você começa a perceber, então, os riscos que envolvem uma decisão de fazer política de uma maneira diferente”, conta Isa. “Não que isso me freie de alguma maneira, mas é claro que eu sinto medo em algumas ocasiões.”

Depois desses dois episódios, as componentes da bancada feminina da Câmara resolveram agir e se uniram contra a violência de gênero: apresentaram uma carta protestando contra o ambiente hostil às mulheres da Casa e também criaram uma CPI com o objetivo de discutir políticas públicas e realizar um mapeamento da violência contra a mulher em São Paulo.

Esse mapeamento também ficou a cargo de Isa Penna, que durante o mandato levantou dados sobre a rede de atendimento à mulher na capital paulista. “Fizemos visitas aos CRMs [Centro de Referência da Mulher] e CCMs [Centros de Cidadania da Mulher] para verificar a estrutura física, o preparo dos profissionais, os procedimentos de atendimento”, detalhou.

Isa Penna e equipe em visita a CCM de Perus, na zona norte de São Paulo (arquivo pessoal)

Convite às mulheres

No ínterim do mandato, a jovem parlamentar conta que conseguiu realizar “mais do que esperava”, apesar do curto espaço de tempo. Mesmo diante de desafios e provocações, ela avalia a experiência como positiva. “Uma mandato político é um baita instrumento para lutar por aquilo que acredito. Valeu muito a pena. Saio dessa vivência mais fortalecida”, afirma.

Junto com as outras parlamentares da Casa, a vereadora espera deixar um caminho mais livre para as mulheres na política.

“Meu mandato, o mandato da Sâmia, são de fato importantes, mas nossas vozes sozinhas não são suficientes. Existe uma pluralidade muito grande entre as mulheres. Nós queremos mais mulheres, queremos também as negras, as transexuais, as lésbicas, as sindicalistas, queremos todas, porque cada uma tem demandas muito específicas. Para ter essa representatividade que tanto almejamos, precisamos de mais mulheres na política que decidam também seguir por esse caminho, por mais que isso exija sacrifícios e tenha lá os seus riscos. Eu não troco isso por nada”, conclui.

(Karen Lemos - Portal da Band)